quinta-feira, 31 de maio de 2012

ADELSON E OS VALADARES

ADELSON E OS VALADARES

O que já era esperado aconteceu.  Houve o rompimento publicamente anunciado do deputado Adelson Barreto com o seu partido, o PSB,  liderado pelo senador Valadares. Se  não for encontrada pelo habilidosíssimo senador uma fórmula  para ainda aquietar o deputado, o rompimento se refletirá negativamente sobre a candidatura do deputado federal Valadares Filho a prefeito de Aracaju. Adelson tem na periferia de Aracaju uma imensa força eleitoral. Ele não se conforma por não  ter sido indicado candidato do partido e lembra que tinha um projeto para transferir o título para Laranjeiras onde  aparecia muito bem nas pesquisas e teria o apoio do grupo da prefeita Ione Sobral em troca do apoio que daria à candidatura a deputado do atual Secretário  de Estado da Agricultura e filho da prefeita, Zezinho Sobral.
  Deixou essa possibilidade pela outra, de disputar a prefeitura de Aracaju. 

A DEMORA E A DÚVIDA

A DEMORA E A DÚVIDA

O adiamento do esperado anúncio da candidatura de João Alves a prefeito de Aracaju fez com que aumentassem as suspeitas de que ele terminará mesmo desistindo, e indicando em seu lugar o ex-deputado federal José Carlos Machado. Foi noticiado que o anúncio poderia ocorrer na sexta-feira dia vinte e cinco, com muita festa, e até a possível presença de cardeais do DEM, entre eles, o senador José Agripino e o deputado federal ACM Neto. Não houve o anúncio, também não houve explicações para o cancelamento, apenas foi informado que João Alves havia viajado a São Paulo. O DÓLAR E AS VIAGENS A euforia comprista de brasileiros no exterior, principalmente em Miami e Nova Iorque, parece estar chegando ao fim. Com o dólar ultrapassando a barreira dos dois reais e a receita federal ficando mais rigorosa na fiscalização de quem chega carregando muitas malas, diminui o atrativo das viagens, para alguns transformadas em negócio rendoso. Já ocorre uma sensível queda nas viagens ao exterior, e as agências começam a desenvolver uma nova estratégia, com o foco concentrado no turismo interno. O que é bom, desde que hotéis e transportadoras não comecem a aumentar ainda mais as tarifas, principalmente no caso dos hotéis, exorbitantes. 

O SAPATO DE ZÉ PEIXE

O SAPATO DE ZÉ PEIXE

 Zé  Peixe,  o homem do mar que faleceu ha um mês, era  um personagem com vida repleta de atos de heroísmo, e também um perfeito asceta. Não tinha vícios, nunca fumou, nunca bebeu, alimentava-se frugalmente, não tomava banho com água doce, e vestia noite e dia um calção raramente usando camisa, mesmo quando fazia a praticagem  de navios na arriscada barra de Aracaju.  Zé Peixe teve um casamento longo, de muita afinidade e amor, que durou até a morte da esposa, mas  o casal, há quem garanta  dele ter ouvido, nunca fez sexo.  As energias ele guardava para suas ousadas  aventuras pelo mar, onde por vezes permanecia  dez a vinte horas nadando, ou boiando para descansar ao sabor das ondas.  A única vez em que o nosso homem do mar calçou sapatos  e vestiu um terno foi para ir a uma solenidade na Marinha do Brasil  quando recebeu uma destacada condecoração.
 Zezinho Guimarães, hoje deputado estadual,  de quem a esposa de Zé Peixe era sobrinha, sabendo que ele se recusava a vestir terno e gravata e calçar sapatos, foi convencê-lo a usar a roupa protocolar, pelo menos durante a cerimônia. Zé Peixe terminou aquiescendo, sem disfarçar o constrangimento,  e com dificuldade  vestiu o terno e colocou nos pés  um sapato preto de cromo alemão que Zezinho lhe deu de presente. 

OS EUROPEUS ESQUCERAM KEYNNES

OS EUROPEUS ESQUCERAM KEYNNES

 John Maynard Keynnes,  um aristocrata inglês que se tornou famoso  economista,  preconizou medidas  que desafiavam a economia clássica   para vencer a grande depressão de 1929.   Suas ideias inovadoras não foram de logo aceitas. Havia um arraigado preconceito contra mudanças que mexessem com o ritmo e sobretudo  a liberdade do livre mercado. Os  americanos e  europeus recusaram-se a crer na eficácia daquelas medidas, vistas como  excentricidades  que desafiavam o bom senso,  no caso a ortodoxia monetária, fórmula infalível para o sucesso dos banqueiros e do sistema financeiro em geral, o mesmo não se podendo dizer em relação ao resto dos agentes econômicos.
Depois do crash  da bolsa de Nova Iorque, até banqueiros saltaram dos seus escritórios no alto de grandes edifícios, indo esborracharem-se no  chão de Wall Street. Foi a primeira e única vez em que o sangue de magnatas escorreu sobre o asfalto.
 Um presidente americano, Franklin Delano Roosevelt, eleito em tempos de crise, e diante de uma explosão social que poderia acontecer a qualquer momento,  quando as massas de desempregados se transformassem em salteadores ou revolucionários, como já acontecia em países europeus, entendeu muito bem a clara mensagem de Keynnes ,  que assim poderia ser resumida:  Em tempos de recessão é válido cavar buracos, depois tapá-los, desde que isso gere empregos.  Havia também , no receituário de Keynnes,  a ideia que apavorava os conservadores : a interferência do Estado na economia. Não se poderia dizer que o aristocrata inglês, ungido Lord do Império Britânico, alimentasse  qualquer conflito ideológico com o sistema capitalista, na verdade, o que ele queria mesmo era salvá-lo,  evitando o debacle total da economia.
O presidente Delano Roosevelt  se transformou no primeiro Chefe de Estado Keynesiano,  e se pôs a cavar e a tapar buracos, quase literalmente; fez planejamento, o que na época  era uma heresia, criou a Tenessee  Valey  Authortity, e levou desenvolvimento ao sul paupérrimo e estagnado, estabeleceu limites para o festim  do mundo financeiro, e o resultado de tudo foi a recuperação econômica, a geração de empregos, o fim da recessão.
A Europa demorou na descrença em relação às fórmulas kenesianas  e o resultado foi a ascensão do  nazi-fascismo como resposta radical à crise.  Salazar em Portugal, Mussolini na Itália, Franco na Espanha, e Hitler, Adolf Hitler, comandando com mão de aço a Alemanha a partir de 1933,  um país afundado numa recessão imensa e numa inflação astronômica. O ditador foi brutal nos métodos policialescos, e cuidadoso com a economia, deve ter lido ou ouvido falar em Keynnes , e adotou suas sugestões. Interferiu pesadamente na economia, traçou um planejamento  de reestruturação da indústria voltado para  duas vertentes: a guerra e a geração de empregos, investiu pesadamente em obras públicas, e até mandou que um engenheiro projetasse um carrinho que ele queria transformar em veículo de uso popular,  sonhando em imitar a popularização feita na América por Henry Ford, que aliás era um entusiasmado admirador e colaborador do nazismo. Surgiu o Volkswagen, mas logo as linhas de montagem iriam mesmo fabricar tanques e canhões.
Enquanto a bacurau alemã ,  Angela  Merkel,  continuar submetendo a zona do euro à sua maléfica interferência, estupidamente conservadora, não há saída para a crise europeia. Agora, a Inglaterra ,  que não obedece a  Merkel, mas, por convicção, adota  as mesmas ideias excessivamente conservadoras, da líder alemã,  entra também em recessão.
 Delfim Neto,   que envelheceu renovando-se e afiando a verve inteligente, disse  que  a bacurau teutônica enxerga a Alemanha como um país santificado, enquanto o resto da Europa para ele seria um bordel.
Se François Hollande não conseguir superar a ortodoxia da  bacurau Merkel,  com suas teses de austeridade à custa do desemprego e da falência,  primeiro vai a Grécia, depois Espanha, Portugal, Irlanda, Itália, e até a França, e a própria Alemanha, austeramente ,   se verá falida.
 
 

O VENTO QUE FAZ A LUZ

O VENTO QUE FAZ A LUZ

É possível gerar luz com o vento,  para iluminar cidades, fazer correr a energia pelos fios e mover máquinas ?  Perfeitamente. Isso estará acontecendo em Sergipe a partir do próximo julho. Não se trata de um processo novo, usinas eólicas já existem faz algum tempo em vários países do mundo, e aqui mesmo no Brasil.  Em Fortaleza,  onde são intensos e permanentes os ventos,  tomou-se a iniciativa pioneira de  instalar algumas torres encimadas por cata-ventos,  e o porto passou a ser alimentado com aquela energia nova. Hoje,  multiplicam-se projetos em todo o Ceará, no Rio Grande do Norte,  em quase todo o nordeste. E Sergipe recebe agora um portentoso investimento para  a instalação de uma usina eólica  que se coloca entre as maiores do país. O processo é simples, o vento move as  enormes pás colocadas a uma altura de cem metros,  e elas  até  giram lentamente, mas  um sistema de engrenagens faz com que, no interior daquelas formas bojudas,  geradores rodem em alta velocidade e produzam a energia. E aí alguém logicamente perguntará: - E quando falta o vento?  A resposta é simples: quando não há vento as pás deixam de girar e cessa a produção de energia.  Cessa e ninguém sentirá consequências,  porque as usinas eólicas integram um sistema de geração onde entram as hidrelétricas, preponderantes aqui no Brasil,  e as usinas térmicas.  Na hora em  que o vento para,  o sistema,  que é interligado, aciona compensações,   em nosso caso,  as turbinas de  Xingó  recebem mais água e rodam  rápidas, evitando colapsos. Por enquanto, a participação da geração eólica é mínima  e não substitui  significativamente as hidrelétricas ou térmicas, mas a inclusão  na matriz energética   de mais usinas eólicas complementará o sistema, evitando futuros apagões. Isso porque,   enquanto trabalham,  as eólicas economizam  a água  nos reservatórios das hidrelétricas, que  podem operar com menor potência.
Sergipe entra nesse mundo da geração de energia de forma privilegiada. Aqui está localizada a grande  usina hidrelétrica de Xingó,  produzimos petróleo, gás, etanol, biodiesel ainda em pequena escala, e já temos o primeiro parque eólico, com boas perspectivas de novos investimentos na área. Na medida em que se ampliarem os parques eólicos, estaremos mais distantes da maldição de uma usina nuclear, aqui, ou nas vizinhanças, com a vantagem inigualável de que a eólica é uma forma de energia absolutamente limpa.
O governador Marcelo Déda,  que montou uma bem sucedida estratégia para captar o investimento e derrubar os obstáculos burocráticos, comemorava a chegada de mais uma turbina vindo da China, e  desembarcando em nosso porto. Depois, quase debaixo das enormes pás da primeira torre já erguida,   recheando sempre sua poderosa oratória com literatura e poesia, foi buscar inspiração em Miguel de Cervantes, no episódio em que o ¨fidalgo da triste figura , Dom Quixote de  La  Mancha,  de lança em riste, põe a trotar o seu lerdo  Rocinante  e investe contra moinhos de vento, não ouvindo as admoestações  do   simplório e cético escudeiro, Sancho Pança,  convicto de que  os moinhos de vento eram ameaçadores monstros,  que até poderiam ameaçar  o sossego da  casta donzela Dulcineia de Toboso,  a quem devotou os seus feitos de cavaleiro andante. Deu-se mal o cavaleiro, chocando-se com uma das pás do moinho e  desabando, do sonho, e do cavalo.
Déda disse que ali, entre os coqueiros da Barra dos Coqueiros, não havia enganos, as torres estavam instaladas, a energia seria gerada, e  abria-se, com um investimento aproximado  de cem milhões de dólares, uma nova fase que ele garantira,  de geração da energia limpa, enquanto lutava, também, pela consolidação de uma política limpa.
Vale a pena, num fim de semana, tomar o carro e ir com a família ver as torres da usina eólica. Basta  cruzar a ponte da  Barra,  ir  em direção à Atalaia Nova, e no cruzamento que leva a Pirambu   seguir pela esquerda, pela já duplicada estrada até o porto, ultrapassar o acesso ao porto,  continuar seguindo em direção a Pirambu.  Logo adiante, no terreno da CODISE que fora destinado ao Polo Cloroquímico  que não vingou,  já podem ser avistadas as primeiras torres de um total de vinte e três que serão erguidas.
 

O ÚLTIMO DOS CONTROLADORES

O ÚLTIMO DOS CONTROLADORES

A lei de acesso à informação chega tarde no Brasil. Mas enfim  chegou, e para isso certamente tiveram de ser vencidos os obstáculos de uma secular cultura regida pelo patrimonialismo,  que terminou fazendo da administração pública uma inviolável caixa preta. Somos a nonagésima nação do mundo a adotar a lei que é fundamental para que  o cidadão comum não  continue sendo  aquele Zé Ninguém,    despossuído total de direitos, estrangeiro na sua pátria, e sem saber o que fazem dela.  A Suécia, sempre referência na valorização da cidadania, abriu o acesso às informações há mais de dois séculos,  quando criou o instituto do Ombudsman,   um funcionário público com mandato e  ampla prerrogativa de ser intrometido,  até para  perguntar e exigir respostas do rei, do primeiro ministro, dos parlamentares.  Não  ficaram satisfeitos os suecos apenas com a participação fiscalizadora de um só funcionário público, e fizeram mais,  abriram a todos a possibilidade  de, cheios de direitos, imiscuírem-se naquilo que sempre interessa muito ao cidadão: saber como está sendo governado, saber o que fazem com o seu país, com o dinheiro dos impostos que  que o governo arrecada. Em grande parte, essa  acessibilidade da população aos negócios do Estado foi responsável  pela evolução social do país.   A Suécia  é um modelo de social democracia que funciona, sem ter sido necessário passar por cataclismos políticos,  nem  fazer experiências  traumáticas como aconteceu no resto da Europa,  que adotou sistemas revolucionários, uns inspirados em generosas ideias que depois foram desvirtuadas, outros transformando históricos ressentimentos num manancial imenso de ódio.  O país  nórdico não é exemplo único, serve aqui apenas como referência do aperfeiçoamento político e social alcançado através de medidas que incentivaram a participação popular, aprofundaram a democracia, tentando fazê-la,  efetivamente,  uma forma de governo onde o povo tem uma presença garantida e fundamental.
  Na Escócia, registrou-se recentemente um episódio que, aqui no Brasil, poderá motivar as pessoas  vítimas de um precário atendimento da rede de saúde pública a fazer um questionamento   válido para  identificar uma das inúmeras mazelas  existentes.
Um escocês que já sofrera danos irreversíveis no seu corpo em consequência de  procedimentos médicos, utilizou-se da lei de acesso à informação para pedir  que o sistema público de saúde colocasse à disposição de  todos uma espécie de prontuário de cada médico, discriminando, por exemplo, quantas cirurgias ele realizou, e quantos pacientes morreram ou sofreram sequelas, sob seus cuidados.   Houve inicialmente uma negativa, mas a Justiça determinou que o cidadão fosse atendido. Depois disso, registrou-se uma sensível redução na cifra de erros médicos, de falhas, de omissões no sistema de saúde escocês, que ,aliás,  opera num elevado nível de eficiência.
 Caso  já existisse uma lei de acesso à informação no Brasil, há cerca de 50 anos passados, coisa absolutamente inimaginável, se teria evitado em Aracaju a calamidade de óbitos em cirurgias, que se verificava no Hospital Santa Izabel.  Àquele hospital,  chegavam as poucas pessoas  pobres do interior que  conseguiam atendimento.  Depois de  alguns exames básicos, eram imediatamente operadas,  e  mais de trinta por cento morriam na sala de operações ou logo depois.  Um  cirurgião recém- formado chegou ao Santa Izabel,  e ficou alarmado com as cifras da mortalidade. Era Francisco Rollemberg,  que passou então a exigir exames mais detalhados em todos os pacientes  pobres vindos  do interior. Descobriu-se, então, que quase todos sofriam de anemia profunda,  causada por má nutrição ou fome crônica.  Antes da cirurgia todos  começaram a ser submetidos a uma alimentação mais completa, recebiam medicamentos durante algum tempo . Somente depois disso  as cirurgias eram realizadas. Houve uma queda vertiginosa na mortalidade, o que se deve também , certamente,  à habilidade já  então revelada pelo jovem médico.
A Lei de Acesso à Informação  é assim, em primeiro lugar, um instrumento eficaz de defesa dos interesses de toda a população. Com esta nova lei não se poderá garantir que a corrupção estaria vivendo  os seus últimos dias, mas, sem dúvidas,  a fiscalização direta exercida pelo povo criará uma barreira para os que se habituaram a manipular como bem entendiam os cofres públicos.
 O povo passa a partir de agora a ser um agente ativo de fiscalização,  assumindo  o papel do último dos controladores, ou seja, aquele que pode pedir e exigir que sejam fornecidas informações pelos três poderes, inclusive dos que controlam esses três poderes, como as Controladorias Gerais, os Tribunais de Contas e o Ministério Público.
Resta agora esperar que cada cidadão  saiba utilizar-se da prerrogativa nova que a lei lhe confere.
 
 

quinta-feira, 24 de maio de 2012

CLIMA DE INSEGURANÇA

CLIMA DE INSEGURANÇA

¨A sociedade continua assustada com a crescente onda de roubos de carros nesta capital, Os marginais agem a qualquer hora do dia  ou da noite e em áreas pretensamente ( ?) policiadas. As rodovias que dão acesso à cidade vivem à disposição dos ladrões, embora existam postos policiais  na área. É preciso que as autoridades ( ? ) policiais tomem enérgicas e urgentes providências . O setor turístico está sendo muito afetado com os roubos  de veículos. Os visitantes não querem se arriscar a perder seus automóveis, uma vez que as notícias chegam  além fronteiras. A polícia tem registrado o absurdo de cinco veículos roubados em apenas um dia!!! Até quando ?¨
 O texto acima foi publicado no Jornal da Cidade, na coluna Notas e Comentários do jornalista Jurandyr Cavalcanti em 19/ 02/97. 

A NOTA DA GENTE E O PROCOM

A NOTA DA GENTE E O PROCOM

 João Andrade, o Secretário da  Fazenda, é homem cauteloso. Planeja meticulosamente todas as ações, tem extremo cuidado em manter o equilíbrio das finanças, e vem conseguindo êxito, apesar de alguns solavancos causados por variações nos repasses federais ocorridos a partir da crise de 2008, e agora, dos temores que acinzentam o horizonte.  João entendeu que estava na hora de criar um instrumento para reforçar a arrecadação, tornando o contribuinte uma peça chave no mecanismo da cobrança dos tributos.  Surgiu a Nota da Gente, com todas as facilidades que a internet  proporciona, mas  quem emite a nota  se não desejar registrar a compra terá de ser instado pelo contribuinte, e, recusando, tornar-se objeto da ação do Procom. Ai a coisa complicou-se, porque o Procom,  apesar de todos os esforços da equipe e do Secretário Benedito Figueiredo, não tem ainda uma estrutura dimensionada para atender às novas exigências. Concurso público demora muito, contratar comissionados é impossível, porque eles não podem ser  agentes públicos aptos legalmente a fiscalizar e multar. A solução seria então deslocar funcionários de outros órgãos para o Procom, e para isso estão trabalhando juntos o Secretário da Justiça e o da   Fazenda.
 

A MÃE DÉ E O PROFESSOR GENARO

A MÃE DÉ E O PROFESSOR GENARO

Dona Dejanira Silva, mais conhecida como Mãe Dé, era uma senhora  idosa que  não casou, mas constituiu uma grande família, criando   muitos filhos. Sua casa simples na esquina das ruas Arauá e Maruim, era sempre movimentada, com os meninos que lá viviam e os amigos numerosos que  chegavam sempre. Nascida em Rosário do Catete, terra  berço de tantos políticos importantes, Mãe Dé,  tornou-se amiga e até confidente de algumas daquelas famílias senhoriais  dos massapês da Cotinguiba.   Conviveu, desde quando ainda eram meninos, com personalidades que se projetariam depois no cenário político sergipano,  como Leandro  Maciel, Maynard Gomes e Luiz  Garcia.  Tornou-se assim conhecedora e participante em muitos episódios, assistiu de perto, vivenciou cenas interessantes que anos depois  contava,   complementando sempre com observações que só a vivência próxima dos fatos e das pessoas permite.  Ao amigo Paulo Costa que  conhecera  quando jovem promotor em Maruim, narrava esses fatos que ele como jornalista saboreava com gosto, e até os anotava, incluindo versos e estórias do folclore da região do qual Mãe Dé era   a memria viva.
 Sobre o inconformismo e a rebeldia que  o futuro ¨tenente¨ Maynard já revelava desde menino, e que   daria sequência depois  nos seus arrojados atos revolucionários, Mãe Dé contava: ¨Na escola, o menino era enfarruscado, falava pouco, mas reclamava muito. A professora mandava que ele soletrasse: tá-a tá-tá-a- tá-bo- o- bo- cê-a-ca, o que é Augusto?  E ele com fala ríspida: Taquara, professora.
Tá errada Augusto,  vou soletrar outra palavra:  Ta-a-ta-a-ta- a-ta- q-u-a- q-u-a- rê--a-ra, o que é Augusto? E o menino: Taboca, professora.
 Mãe Dé começava  suas estórias sempre  entoando como se cantasse a exortação de curandeiros, corrente na região: ¨Com dois te botaram com dois em te tiro, quem vai pra Marreca, passa no Retiro¨.
Entre os meninos que Mãe Dé criou, estava um a quem ela dedicava maior atenção. Ele tinha na frente da casa um quarto especial, só por ele ocupado. E ela dizia: ¨Esse  gosta de estudar, é fraquinho e precisa um tratamento melhor¨. O menino chamava-se Genaro, era mesmo ¨fraquinho¨, magro, de uma brancura amarelada, olhos esbugalhados, vivia atormentado por uma dor de dente constante que o fazia consumir vidros e mais vidros de Guaiacol, um remédio  de cheiro forte para aliviar o incômodo  que por vezes o prostrava. O quartinho era atulhado de livros, quase todos de matemática e física. Genaro era fascinado pelos números, e falava em coisas que poucos entendiam: paralelas se encontrando no infinito, espaço curvo,  cálculo infinitesimal, teorema de Fermat. Formou em torno dele um  grupo de alunos quase todos tentando fazer o vestibular  para a Escola de Química, que era puxado, fazendo jus à fama da escola superior que em Sergipe ganhara renome nacional.  Insistia para que os alunos procurassem fazer demonstrações originais, e os desafiava com o Teorema de Pitágoras.   Dois desses alunos revelaram um grande pendor para as matemáticas. Um foi Mário Luiz Figueiroa, que se tornou oficial da Aeronáutica e morreu cedo,  aos 24  anos, fazendo arriscada manobra acrobática; o outro tornou-se psiquiatra,  Eduardo Vital Santos Melo, que morreu  aos 52 anos, nunca  convencido de que agira acertadamente ao trocar a vocação de monge pela  profissão de médico, embora tenha sido um monge dos mais ascetas durante toda a vida.
Genaro  Dantas Silva, como não poderia deixar de ser, tornou-se professor,  primeiro da Escola Técnica, hoje IFS, depois da UFS, e é agora uma referência nacional quando se fala em grandes matemáticos.
A  nossa Universidade Federal fez a Genaro a maior das homenagens acadêmicas, tornando-o Doutor Honoris  Causa. Não poderia haver um reconhecimento mais adequado ao cientista que se fez com inaudito esforço, num ambiente antes tão adverso à ciência, onde o empolado saber bacharelesco servia apenas para  demonstrar superioridade doutoral, e quase nada mais. A Mãe Dé cumpriu a sua sacrificada tarefa de criar e dar educação ao menino   ¨fraquinho.  A UFS, na mesma solenidade, concedeu a Medalha do Mérito Universitário ( in memoriam ) ao professor Arivaldo Montalvão Filho,  tornou professores eméritos, entre outros, Gilza  Luisa  da Mota Gomes e Luiz Alberto dos Santos, e fez ainda moção de agradecimento ao governador Marcelo Déda e a toda bancada sergipana no Senado e na Câmara.
 

A BODEGA, A PMS E O CÓDIGO DE ÉTICA

A BODEGA, A PMS E O CÓDIGO DE ÉTICA

Em um pobre bairro de Aracaju, há coisa de uns cinquenta anos, havia, em uma humilde bodega de esquina, escrita a tinta vermelha, numa tabela afixada na parede a  frase: ¨Atendemos com honestidade, presteza, eficiência e  educação¨.   O proprietário, sempre com o lápis na orelha para fazer as anotações nas cadernetas  do¨ fiado¨ de tantos fregueses, era um galegão  de faces avermelhadas, vindo das beiras do São Francisco, denunciando, no físico, provavelmente uma descendência  dos holandeses que andaram por lá se refugiando após a  frustrada ocupação de Pernambuco pela multinacional Companhia das Índias. Era homem sempre pronto a dar opiniões sobre tudo, desde política à melhor maneira para conter a carestia sem depender da SUNAB, a  inócua Superintendência Nacional de Abastecimento  e Preços. Visionário, sonhava transformar o seu acanhado negócio numa rede de lojas, e, para isso, todos  os dias anunciava uma promoção,    ensaiando uma estratégia de  marketing que fazia rolar de boca em boca . ¨Amanhã é dia da banha com o preço mais barato de Aracaju.¨  E assim a bodeguinha  ia crescendo, certamente chegaria a transformar-se num portentoso negócio de supermercados, igualzinho aos que fizeram outros sergipanos pobres, também, todavia arrojados e pioneiros, isso, se um enfarto não houvesse prematuramente levado o esperançoso negociante. Mas, além do dom inato para comerciar, ele tinha algo de inédito para aquele tempo: seguia uma  linha de conduta, considerava o respeito ao cliente  requisito indispensável para o sucesso do seu negócio, por isso, estava sempre a mostrar no  quadro pregado à parede a frase que era  a própria síntese inovadora de um código de ética: ¨Atendemos com honestidade, presteza, eficiência e educação ¨.
Aquele homem simples, tocando um pequeno e incipiente negócio, tinha a convicção de que sem  regras, sem a obediência a normas e a princípios,  até mesmo uma humilde bodega de subúrbio corre o risco de mergulhar na mesmice de tantas outras semelhantes que se perderam na insignificância, por não terem um diferencial que  as caracterizasse. De resto, e num plano mais amplo, a obediência a princípios éticos é imperativo,  sem o que as sociedades degeneram.
Muito se comenta agora sobre o projeto de lei do Executivo  em análise na   Assembléia  criando um novo código de ética para a Polícia Militar. É um passo à frente, um marco de evolução e modernidade. A polícia Militar de Sergipe é regida ainda por regulamentos que datam do período em que as PM eram subordinadas ao exército como forças auxiliares. Por isso, se fazia necessária uma atualização aos novos tempos, Ocorreram equívocos no texto inicial, e esses equívocos estão sendo  tratados como se fossem a essência do projeto. Os equívocos foram retirados.  Assim, o irrelevante, desnecessário, ou até quase absurdo, não mais está incluído no debate. Há que se tratar agora do projeto,  e a ele incorporar sugestões,   ideias, no sentido de aperfeiçoá-lo, porque certamente não é o código proposto  uma obra perfeita e acabada.
Não se pode entender um código de ética como camisa de força, até porque  a matéria sugerida aos deputados não passa de algo   idêntico ou bem assemelhado  aos demais códigos de ética que outras policias militares já adotaram. E sem tanta balbúrdia.
 Assim como o pequeno  comerciante seguia normas para melhor servir aos fregueses, uma polícia militar não pode deixar de obedecer a um código de ética para melhor servir à sociedade.  O comerciante sabia da sua dependência em relação aos fregueses, os policiais militares,  como servidores públicos, devem ter consciência  da relação de respeito ao contribuinte, ao cidadão que lhes paga os salários. Um Código de Ética  valorizando a atividade policial  poderá ser um bom instrumento para consolidar essa benéfica relação.
 

OS DOIS HINOS DO NORDESTE

OS DOIS HINOS DO NORDESTE

Luiz Gonzaga era ainda um quase desconhecido estreante no rádio,  quando, em 1947 compôs,   em parceria com Humberto Teixeira, a música Asa Branca.
¨Quando olhei a terra ardendo, qual fogueira de São João eu perguntei a Deus do céu,  aí, por que tamanha judiação.  Assim começa a letra da música que se  tornou uma espécie de hino não oficial do nordeste.
A melodia é um primor, a letra, o primeiro sofrido grito do sertanejo do nordeste que o Brasil todo ouviu.
Asa  Branca virou música cult, correu mundo, transformou-se , arranjos diversos deram-lhe feição de jazz, de  sinfonia, e até os Beatles tiveram suas atenções voltadas para a beleza da criação, diríamos, quase sublime, do nosso Gonzaga e seu parceiro igualmente genial.
George Moustakis,  músico  que  na Europa se fez  porta-voz dos gritos reprimidos de liberdade  nos países latino-americanos  sob ditaduras, entre eles o Brasil, incluiu no seu repertório a Asa  Branca, ao lado de hinos revolucionários de todas as épocas.    Março  de  2001, em Barcelona,  Moustakis fazia uma apresentação no Palau de la Musik, assim,  escrito em catalão. O velho teatro de linhas clássicas, montado quase todo em ferro fundido, estava repleto de militantes que haviam resistido ao fascismo, e naquele mesmo teatro, naquela data, trinta anos atrás, foram  agredidos pela polícia do ditador Franco.  Havia entre eles alguns bem idosos, antigos combatentes  na Guerra Civil espanhola ( 1936-1939)  .  Um coro de mais de mil vozes acompanhava sempre as canções,   hinos de guerra dos tempos de luta.  Moustakis encerrou a apresentação tocando Asa  Branca, dedicando-a  a um jornalista sergipano que o encontrara antes do show em um restaurante e lhe pedira uma música brasileira, e ainda,  homenageando  o escritor Jorge Amado que estava enfermo e atravessava os seus últimos meses de vida.
O hino do nordeste, como se vê , saiu por este mundo afora.
     Há um  outro hino,  nordestino também,  poesia pura, todavia dramática,  distante da esperança, realista, vigorosa para o seu tempo,  e que termina sem ¨os  verdes olhos  ( de Rosinha) se espalhando na plantação¨ como na letra de Asa Branca.  A família de retirantes depois da sofrida viagem,  sobrevivendo em São Paulo,  ¨não volta mais não. É a Triste Partida,  do sublime Patativa do Assarê, que Luiz Gonzaga cantou e celebrizou.  A  odisseia do nordestino, batido, derrotado pela seca, é contada  na década dos sessenta, quase vinte anos depois de Asa Branca, mas aí, já estávamos na ditadura e falar em sofrimento do povo era subversão.
 A música de Patativa do Assarê  é agora uma reminiscência que não traduz mais a realidade nordestina. Houve mudanças para melhor. Acabou-se o  ¨Pau de Arara¨ , os caminhões  atulhados de  gente como se fosse gado fugindo da seca,  rolando pelas estradas, tentando chegar a São Paulo. Uma rede de proteção social evita  a epidemia da fome e a região transformou-se na que mais cresce no país. Por aqui, coisa inusitada, já se registra até carência de mão de obra.
Mas a seca,  fenômeno climático recorrente, continua acontecendo, e com ela estamos longe de estabelecer um pacto de convivência.   Atravessamos agora mais um período de longa estiagem. Dois anos sucessivos sem trovoadas, invernos fracos, causaram  a pior das situações vividas pelo sertão, que é  a falta de água nos açudes.
 O governo federal, que desde o Império vem construindo grandes açudes pelo nordeste, entendeu que Sergipe e Alagoas com pequena área incluída no semiárido  e às margens do São Francisco, ficariam fora do programa de açudagem.  Temos apenas um grande reservatório, o açude Duas Barras, em Gracho Cardoso, que permanece cheio .
Aconteceu a reforma agrária, grandes latifúndios foram repartidos, e nasceram os assentamentos do MST, todos dependendo da ocorrência de chuva e desprovidos de um sistema eficaz  para acumulação de água. Cresceu a população sertaneja assistida pelos programas sociais, e numa boa parte dos assentamentos começou a desenvolver-se a pecuária leiteira. Então, o suprimento de água para o rebanho , a alimentação, tornaram-se o grande problema quando escasseiam as chuvas.  Não dá para sustentar boi e vaca pagando tarifa da água da DESO ,  impossível também de ser levada por rede de adutoras a todos os locais.
  Houve o reforço emergencial na rede de assistência, com mais cestas básicas e ampliação do numero de pessoas atendidas pelo  Bolsa Família. A grande dificuldade hoje é levar água em caminhões-pipa   para não deixar que o rebanho morra de sede. Um caminhão leva em média sete mil litros de água,  um rebanho de dez vacas consome  em média seiscentos litros diários, e são milhares de animais sedentos. Sem água suficiente a vaca não produz leite, mesmo que tenha uma boa ração.
A grande dificuldade é  que, apesar de séculos e mais séculos de seca,  não existe ainda uma estratégia eficaz para adequar a vida do ¨catingueiro¨ao local onde ele mora, planta, cria e tenta produzir.
 O semiárido sergipano parece ter encontrado sua principal vocação econômica na pecuária leiteira.   Esse é um fato recente, e é preciso agora que se criem as condições básicas para que a atividade que deu certo se amplie, sem os percalços dos tempos certos em que a chuva é incerta.
Há algum tempo o governador Marcelo Déda vem insistindo em Brasília sobre a necessidade de um tratamento específico para o semiárido nordestino, para que se desenvolva um projeto capaz de aposentar definitivamente os carros pipa, indispensáveis ainda, porque não se fizeram,  na quantidade que é necessária,  as obras essenciais para que a seca deixe de ser sinônimo de prejuízo, sofrimento, desesperança.
   Se conseguir  alterar o comportamento de tecnocratas enfiados nos seus gabinetes , apegados a modelos que não se aplicam  ao sertão nordestino, e torná-los mais atentos ao saber eficaz da ¨experiência feita¨ de que já falava Camões no século dezesseis, se conseguir fazer  isso, a presidente Dilma poderá,  enfim, desamarrar o nó que existe em tantos ministérios, e, finalmente, trazer ao semiárido nordestino as ações que  poderão  superar  os obstáculos do clima, coisa que em tantos países há séculos já foi feita.
Precisamos fazer com que  a Triste Partida do poeta Patativa do Assarê  seja sempre a canção exaltada e relembrada de um tempo que ficou no passado, e da Asa Branca, um hino  de esperança e vitória sobre a secular adversidade.

domingo, 13 de maio de 2012

A COMISSÃO DA VERDADE E SERGIPE


A COMISSÃO DA VERDADE E SERGIPE
 Instalada a Comissão da Verdade recai sobre os ilustres membros que a integram a difícil missão de, em dois anos, incorporar à Historia os episódios ainda obscuros que ocorreram tanto nos porões da ditadura ( 1964-1985) como nas salas atapetadas de onde saíram as ordens para  a ignomínia. Há um lapso na nossa vida como povo e ele terá de ser preenchido exatamente com a veracidade, indispensável para que se  restabeleça a trajetória real seguida pelo país, da qual não podem ser extirpados pelo esquecimento, os crimes, as violências, os desvios, comandados ou permitidos pelas instituições. Não se trata de retaliar, de por na ordem do dia sentimentos de vingança, nem sequer da punição justa através da Justiça, trata-se, apenas, de elaborar o quadro real  do Brasil naquele tempo em que a censura, o medo,  a presença constante do estado policialesco,  impediam  a informação ou escamoteavam a realidade.
Mas a Comissão da Verdade não se limitará apenas ao período da última ditadura, ela devassará ,  também,  um tempo que vai de 1946 até 1985, passando assim pelo período imediatamente após a queda da ditadura de Vargas,  a Constituinte e os governos do  marechal Eurico Dutra, de Getúlio, dessa vez ungido pelo voto popular, de Juscelino Kubitschek, do fugaz Jânio Quadros, de João Goulart, deposto pelo golpe. Nesse espaço de tempo ,  apesar de vivermos uma experiência democrática,  há muito a ser esclarecido, desvendado, para que se recomponha a linha dos acontecimentos.  O presidente Dutra que se dizia seguidor do  ¨livrinho¨,  ( a Constituição ) deslizou pelo autoritarismo  com a conivência do Congresso Nacional. Ferozmente  anticomunista,     Dutra, quando Ministro da Guerra de Getúlio hesitou em mandar tropas brasileiras para o combate contra o nazi-fascismo com o qual flertara durante longo tempo. Instalou uma versão brasileira do macarthismo, e em Sergipe ocorreu um dos mais duros episódios da repressão. Sem culpa formada foram mandados para a Penitenciária, depois para um improvisado campo de concentração, intelectuais, operários, estudantes, professores, jornalistas, todos acusados de ligação com o proscrito Partido Comunista Brasileiro. Houve torturas, quase sempre comandadas pelo almirante fascista Pena Botto ,  que veio instalar-se em Aracaju para coagir e ameaçar autoridades, inclusive o próprio governador Arnaldo Rolemberg  Garcez. Entre os presos naquela época, Tonico Alfaiate, que depois viria a ser Juiz de Direito, Osório Ramos, servidor publico, depois também Juiz de Direito, Jose Rosa de Oliveira  Neto, o professor Franco Freire. Todos já estão mortos. Resta vivo um jovem,  então com 15 anos, aluno do Atheneu, que não foi preso na sala de aula porque a diretora Thetis Nunes, reagiu, dizendo  que não tinha vocação para ser uma madre Joana Angélica, mas, se fosse preciso, dela repetiria o gesto. O aluno foi o intelectual Ezequiel Monteiro, preso na sua cidade, Laranjeiras, e conduzido a Aracaju amarrado no fundo de um Jeep. Entrou na Capitania dos Portos cantando a Marselhesa, o hino nacional francês, e  com isso despertou a fúria  do almirante troglodita que o interpelou aos berros , mandando que ele parasse de cantar  aquele ¨hino comunista ¨.
Como basicamente a Comissão da Verdade trata de violações aos direitos humanos, daqui de Sergipe poderiam partir as iniciativas, não só sobre este caso, durante o governo Dutra, mas também de outros acontecidos ao longo do tempo, como no período entre 56 e  58, quando o então Secretario de Segurança Pública, depois Secretário da Justiça Heribaldo Dantas Vieira, instalou uma fase descontrolada de violências. Esses episódios serão detalhados em livro escrito pelo Procurador de Justiça aposentado Jose Gilson dos Santos , cuja família foi vítima das mais terríveis perseguições.  O livro, Algumas Visões de Sergipe, será publicado  este ano pela SEGRASE.
A mais recente das atrocidades,  que não pode ser esquecida, é o episódio de 1976, quando o quartel do 28º BC foi transformado numa masmorra,  onde sádicos fardados fizeram inimagináveis sessões de tortura. É preciso esclarecer as motivações daquela truculência, num período em que  se processava a abertura política,  ¨lenta, gradual e segura ¨ como queria o presidente Geisel, enfrentando a resistência dos grupos radicais comandados pelo ministro do  exército,  general Sílvio Frota. É preciso que conste, na História pátria, o nome de todos os que participaram daqueles crimes abjetos, dos quais foram vítimas tantos sergipanos, entre eles Milton Coelho, que resultou cego para o resto da vida em consequência das torturas.

¨ MENAS CHAMPAGNE MINHA GENTE


¨ MENAS CHAMPAGNE  MINHA GENTE ¨

Fazia-se, antes, o assalto aos cofres públicos com um certo  recato, algum comedimento na forma de agir. Mas, lá se foram os tempos dos ladrões de casaca,  a coisa não apenas vulgarizou-se, na verdade, avacalhou-se a prática da  subtração indevida do alheio.  Antes, precaviam-se os senhores de colarinho branco, que atuavam  obedientes ainda a uma liturgia  distante da promiscuidade. Afinal, peculato é algo reservado aos  que detêm o privilégio de um cargo público. Distinguem-se,  portanto,  dos simples  larápios, cujo raio de ação não alcança  a área exclusiva dos cofres públicos, estes, esvaziados apenas por quem  deles possui as chaves, e,  por isso mesmo, não são ladrões comuns, são definidos com nome especial:  peculatários.   Alguns desses peculatários ainda desfrutam da prerrogativa singularíssima do foro especial. Em assim sendo, esperava-se dessas pessoas assim tão  distintas, tão qualificadas, que assumissem um comportamento pelo menos condizente com o tipo de roubo que praticam.
A quadrilha do Cacheira e do seu sócio o senador Demóstenes ,   conseguiu a proeza de aviltar a indecência. Não se sabe se foram excessivamente ousados, imprevidentes, ou  teriam  se imaginado inatingíveis, tal era o poder que ostentavam. O certo é que Cacheira e Demóstenes inauguraram uma nova era  na  roubalheira institucional,  um estilo absolutamente despreocupado, totalmente descontraído. Usavam o telefone com a certeza de que ninguém iria interceptar os seus diálogos mafiosos, afinal, Demóstenes era,  na ficção que representava, um dos ícones da moralidade pública,  ocultando o cínico completo, o desavergonhado sem limites.
No meio daquela promiscuidade toda, alguém,  com uma réstia de comedimento,   em meio às comemorações frequentes  pelo êxito da quadrilha,  usando o linguajar próprio da escória de rufiões das sarjetas e dos palácios, menosprezando  a gramática e invertendo o gênero do champagne,  da mesma forma como avacalhavam a ética, poderia ter sugerido alguma precaução:  ¨Menas  champagne  gente boa ¨.

O CHEVAL BLANC DO SENADOR


O CHEVAL BLANC DO SENADOR

O ainda senador Demóstenes Torres  deslumbrado com o sucesso da sua quadrilha, tomou-se de sofisticado gosto pelos vinhos mais raros, vinhos finíssimos, coisa de gente   que pode e quer ostentar riqueza. Sua predileção:  um Cheval Blanc,  safra de 1947, ainda encontrável em algumas lojas especializadas ao preço,  para quem  fatura sem suar a camisa, muito doce,  ínfimos   trinta mil reais. O impoluto senador era regularmente abastecido com garrafas do Cheval  Blanc, que o Cachoeira fazia chegar de Miami .  Demóstenes  tornou a  raridade um continuado prazer,  a dividir  com a jovem mulher, curtindo ainda o enlevo de uma lua de mel.
Demostenes Torres  é, como se sabe,  Senador da  República, também Procurador de Justiça do estado de Goiás. Até a surpreendente descoberta de que o  importante personagem era um dedicado  servidor  do submundo do crime,  tratava-se de um cidadão acima de qualquer suspeita. Rígido defensor da moralidade pública, dedo em riste a denunciar corruptos, Demóstenes  parecia cultivar as sutilezas de um jogo duplo. Era o moralista na tribuna do Senado, e o amoral absoluto, enquanto sorvia o Cheval Blanc de trinta mil reais. Um personagem perfeito a encarnar todas as contraditória facetas e  podridões do ser humano.