OS VENENOS O PASSARINHO E O CÂNCER
Dos pastos sergipanos quase desapareceram a
perdiz, a codorna, a nambú. Dessas largas extensões onde só medra o capim
sumiram quase todos os pássaros. O mesmo acontece nas grandes plantações. O sumiço
das aves que sobrevivem apenas no que resta de matas, de caatingas, de
capoeiras, é o sinal mais claro do avanço dos eufemisticamente chamados
defensivos agrícolas. Usados sem controle, sem obediência às normas que
estabelecem como se deve aplicá-los, e mais ainda, vedam completamente a
utilização de certos tipos de agrotóxicos, esses produtos , que de qualquer
forma oferecem riscos, se transformam em venenos, apontados quase todos como
cancerígenos, causadores de uma infinidade de outras doenças. A comercialização
clandestina dos venenos e a cumplicidade ou ignorância de muitos pecuaristas e
agricultores, aumenta exponencialmente os riscos. Os pássaros, podendo voar, se
deslocam para outras plagas, isso, enquanto restar um refúgio, um local qualquer
do mundo que ainda não esteja envenenado. No nosso caso, sendo bípedes implumes
e, ainda mais, gregariamente agarrados à moradia, não há como fugir da
letalidade dos venenos, que estão nos alimentos, no ar que respiramos, nos
rios, nos oceanos, deste planeta que tanto degradamos.
O agrônomo Arício Resende da Silva faz a
terrificante denúncia: ¨Estamos comendo veneno¨. E explica, didático, que basta
constatar a cifra do nosso consumo anual de 15 mil toneladas de agrotóxicos, o
que corresponde a quase 2% do nacional que é de 800 mil toneladas.
Aqui no Brasil proíbe-se a caça, exceto no Rio
Grande do Sul onde durante 3 meses se pode praticá-la, mas, apesar disso a vida
silvestre em quase todo o país está em acelerado processo de extinção. Quem há
mais de 50 anos praticava a ¨nobre arte cinegética ¨como elegantemente o
professor Franco Freire denominava a caça esportiva, lembra, que nos arredores
de Aracaju era possível abater perdizes, um ambicionado troféu, pouco adiante,
nos limites com São Cristovão, Itaporanga, a paca era encontrada ao longo das
margens dos pequenos rios ainda límpidos, como o Poxim, hoje um esgoto. O
professor Franco Freire era caçador e também ambientalista, embora o termo
naquele tempo fosse desusado. Ele , já idoso, marchando ágil e vigoroso
portando com orgulho uma espingarda Saint-Etienne, calibre 12, joia da armaria
francesa, recomendava a um dos seus alunos do Atheneu a quem ele concedia a
honra de acompanhá-lo, que fosse comedido no abate das ¨peças ¨, que não
fizesse fogo na mata, que preservasse os ninhos, os animais recém nascidos, que
considerasse a floresta um refúgio da natureza a ser conservado. Naquele tempo
, quando ainda não eram tão intensivamente usados os pesticidas, mesmo com a
caça sendo praticada a fauna silvestre se reproduzia, até aumentava, e o câncer
não era o flagelo de hoje.
Apesar de toda a fiscalização do IBAMA, da Adema,
há pecuaristas e agricultores usando herbicidas intensivamente, alguns tão
fortes e letais como o ¨agente laranja ¨, com o qual os americanos desfolharam
e mataram as árvores das florestas do Vietnam, onde se refugiavam os
guerrilheiros do Vietcong. Nos pastos sergipanos não se ouve o cantar de um só
pássaro, a paisagem é desoladora, há no ar o cheiro forte dos herbicidas, o
gado pastando contamina-se, depois, a carne, o leite que consumimos, nos
causará o câncer. O mesmo acontece com as frutas e verduras.
Tem razão o agrônomo Arício: Comemos veneno . Ao
mesmo tempo nos tornamos perigosos inimigos da natureza que nos protege.