quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

O ESCÂNDALO DO PANAMÁ E OS NOSSOS ESCÂNDALOS



O ESCÂNDALO DO PANAMÁ
E OS NOSSOS ESCÂNDALOS
A primeira tentativa de construção do Canal do Panamá, entre 1880 e 1889      fracassou, e o caso gerou um escândalo de tamanhas proporções que o substantivo  transformou-se em adjetivo, para classificar assaltos aos cofres públicos ocorridos, desde então, em qualquer lugar do mundo. Só que a denominação Panamá é absolutamente descabida, e também injusta, por colar a pecha de corrupto ao pequeno país que  entrou na estória apenas por um condicionamento  geográfico.  O  Panamá é um istmo ligando  dois continentes  e separando dois oceanos.
Exatamente por isso   foi escolhido para nele ser rasgado o canal  entre o  Atlântico e o Pacífico, reduzindo-se o tempo e o custo de uma extensa navegação contornando o continente sul americano.
Fernando de Lesseps com a fama de ter sido o construtor do Canal de Suez,  inaugurado em novembro de 1869,        queria reeditar a façanha  dez anos depois , e lançou a idéia de um novo canal,  desafio ainda maior à engenharia da época, e uma convocação aos  financistas franceses, deprimidos com a drenagem de recursos para pagar pelo retorno de um pedaço da França ocupado, após a derrota na guerra travada com a Prússia. Além da guerra perdida, os franceses recuperavam-se de um  outro  trauma: a Comuna de Paris, o governo improvisado e  transformador que se estabeleceu  durante 72 dias, e que terminou com um massacres brutal realizado pelos exércitos que deixaram o front onde combatiam os prussianos, para esmagar o povo, no ensaio de uma experiência de democracia  e gestão revolucionárias. As elites francesas, atônitas e humilhadas, viram, na idéia do Canal, uma maneira de refazer as glórias da França, e também de encherem os bolsos. Os banqueiros a princípio  resistiram .  Lesseps , com o prestígio do seu nome, realizou subscrições populares, amaciou com muito dinheiro a grande imprensa  que entoava a cantilena do fracasso, e, enquanto não via a cor do dinheiro, denunciava, vigorosamente, a aventura que seria feita à custa dos cofres públicos. Como é bem sabido , a rigidez ética dos grandes formadores de opinião se resume num dito tão cínico como realista  de Assis Chateaubriand,  o dono dos Diários Associados,  maior império de comunicação já instalado no país: ¨ Para mexer no editorial é preciso  pagar a folha ¨ .
Logo, os grandes jornais franceses derramavam-se em entusiasmadas louvações à monumental obra que revolucionaria a economia   com a expansão rápida do comércio global.
O Panamá nem chegara a ser ainda um país, era apenas um  pedaço  do território da Colômbia,habitado por gente inconformada com a dependência.  A Colômbia, por concessão de 90 anos, cedeu  o Panamá a um general e um aristocrata  franceses, que a  transferiram a Lesseps.
A construção do Canal começa, e logo  se sucedem os escândalos. Instalou-se um comércio de carne humana. Negros são recrutados aos milhares na África e no Caribe por uma empresa que cobra 75 francos por cabeça, e aos escravizados trabalhadores só paga dez. Os banqueiros recebem juros indecentes, as obras são superfaturadas. Lesseps insiste num traçado circundando elevações,   imaginando manter todo o canal ao nível do mar, para evitar eclusas.  O preço do empreendimento torna-se astronômico. Entram em cena ministros, senadores, deputados, barões, banqueiros, jornalistas, empresários, lobistas.  O custo da propina corre paralelo ao da obra. E os cofres franceses vão sustentando  o festim. Lesseps, quase octogenário, é muito mais um visionário vaidoso e determinado do que  corrupto, convicto de que a importância da obra  tornava irrelevantes as  criticas sobre  os meios utilizados para  viabilizá-la. Na iminência  do fracasso convida Gustav Eiffel o engenheiro famoso que imortalizou seu nome na   torre que acabara de construir, e, por isso, um personagem mítico na cabeça de todos os franceses. Eiffel,  já idoso, vai ao Panamá onde as febres dizimavam os trabalhadores que morriam em maior proporção do que soldados em campos de batalha.
A Companhia do Canal do Panamá  já fracassara, afundada em dívidas ,desacreditada pelas denuncias e malsinada pelos franceses crédulos, que sacrificaram suas economias no temerário projeto.
A oposição transforma o Canal do Panamá em um grito de guerra incessante contra o governo, que se torna ainda mais suspeito quando o Ministro da Justiça engaveta as denuncias.
Em fevereiro de 1889 a Companhia do Canal é dissolvida pela Corte de Justiça, mas só em junho de 1891 o procurador- geral Quesnay de Baureperie produz a demolidora peça de acusação, na qual, pela primeira vez na história da França,  figuram dois oficiais da Legião de Honra: Fernand de Lesseps  e Cornelius  Hertz, este, um médico que nunca clinicou, e bem sucedido intermediário de grandes e escusos negócios. Braço direito do poderoso barão Jacques Reinhart,  especializou-se em distribuir o que na época era chamado ¨manás do Panamá,¨ entre as grandes personalidades da República.O médico, lobista privilegiado, levava ao Presidente da República, e Ministros, pessoas interessadas em grandes negócios. Amansou o árdego  George Clemenceau, que, futuro primeiro ministro, receberia a denominação elogiosa de O Tigre, todavia, o lobista o teria ajudado a montar o  jornal La Justice.  Hertz jactava-se de ter em seu poder uma lista de cento e dois deputados aos quais pagava propina, entre eles, o presidente da Câmara, Charles Floquet. Surgem delatores, caem ministros, entre eles o das Finanças, travam-se intensos e  tumultuados debates na Câmara e no Senado , deles participam extraordinários advogados .
Forma-se uma comissão de inquérito. Nela, o banqueiro Thierée revela ter uma lista de 26 cheques entregues ao barão  Reinhart,  totalizando mais de três milhões de francos,  repassados a dois senadores e um deputado. Surgem mandados de prisão, e entra em cena um personagem que ficou célebre: o policial  Clement, que o povo logo apelidou: Pai Clement. Ele foi bater à porta de vistosas autoridades, e até localizou os cheques descontados .
 O presidente da Câmara se disse inocente e vitima de uma conspiração dos adversários, até que um jornal publicou uma declaração  assinada, que ele, antes, usando estratégia diferente, havia  feito, confessado que recebera trezentos mil francos, mas, fizera isso para salvar a República. Desistiu da estratégia anterior, e esqueceu-se de avisar ao jornalista.
No episódio seguinte, desaparecem todas as possíveis similitudes com os nossos escândalos: Um deputado jovem e estreante, herói de guerra , sobe à tribuna para fazer uma denuncia e um desafio. Lembra que o barão Reinhart suicidou-se, mas  ele teria um cúmplice que todavia o traiu . E afirma: ¨Este homem vós o conheceis. Seu nome está em vossos lábios; mas nenhum de vós seria capaz de citá-lo, porque ele possui três coisas que temeis: sua espada, sua pistola e sua língua!  Pois bem, quanto a mim,  afronto as  três, e lhe declino o nome: é Clemenceau.
Ofendido, o grande tribuno e polemista reage, chama o acusador de mentiroso.
 O duelo verbal  deu lugar a um duelo real , a pistola. Clemenceau é exímio atirador,  pratica o tiro com freqüência. Travou-se o duelo. Cada um dispara e erra três tiros, e a honra está reparada. Nos jornais surgiram insinuações de que Clemenceau errara de propósito, porque, se matasse o ousado deputado, o povo o trucidaria depois.
Os ¨Panamás ¨ na França e no Brasil são semelhantes, mas nessa questão de honra as  diferenças são gritantes.  Por aqui a palavra honra há muito tempo perdeu o significado.
Uma Câmara que tem  Eduardo Cunha a presidi-la é uma   desonrada  Casa de todas as tolerâncias.
  Outra diferença que, aliás, muito nos honra: No Escândalo do Panamá,  a maior parte dos acusados foi condenada. Mas  as instituições foram lenientes, e os crimes prescreveram.   

UM AMIGO À MODA ANTIGA



UM AMIGO  À
MODA ANTIGA
Carlos Barreto Souza,  Carlinhos Machado, como era mais conhecido, foi um cidadão que  em vida plantou e cultivou amizades. Era solícito, solidário, desses que se lembram  de telefonar sempre para saber como estava o amigo. À moda antiga,  desconhecia as redes sociais, e assim suas amizades não eram virtuais, distantes, vagas, mutantes.Era amigo que comemorava sucessos e chegava perto na dor ou no insucesso, partilhando-os, as vezes com o silêncio sincero da solidariedade, que não precisa de voz, mas se materializa no gesto.
Carlinhos tinha uma devoção especial: cultivar a memória do pai, o notável pediatra e humanista Jose Machado de Souza, o Dr. Machado. Acompanhou os últimos e sofridos anos,  dele, e da mãe, a altiva e forte Dona Anita.
Carlinhos nos últimos meses não telefonava aos amigos, isolou-se, doente, e poucos sabiam. Ao seu lado a irmã Rosa, a filha os netos. Depois, chegou a irmã Laura, e logo  comunicava aos amigos, ainda  inscientes, que silenciosamente, e sem abandonar o cigarro, ele se fora.
Faria 76 anos neste janeiro.

OS REJEITOS QUE A VALE DESPREZA



OS REJEITOS QUE
A VALE DESPREZA
Por que falar  da Samarco, a mineradora irresponsável que jogou lama sobre uma parte do Brasil ?
A Samarco é  somente um tentáculo da VALE a grande empresa multinacional que nem mais parece brasileira, tal o seu desprezo ao país onde ainda tem sede. Mas apesar da  insensibilidade indiferente do seu arrogante e um tanto cínico poderoso presidente, Murilo Ferreira, a VALE precisa ser responsabilizada, e também  manter-se operacionalmente ativa, e isso se aplica também às grandes empresas de construção cujos dirigentes foram parar na cadeia. São empresas que além de grandes empregadoras, geram imensos impostos e têm um longo know – how de experiências acumuladas, algo insubstituível. No caso da VALE, além das indenizações indispensáveis, do compromisso em recuperar o gigantesco dano ambiental, seria essencial a permanência das atividades de mineração . Há meios, há tecnologias disponíveis, para que se evite o acumulo da lama, no caso de Mariana, com o agravante de ficarem as barragens sobre uma serra que é um divisor de águas. A lama pode ser usada em cerâmica, entre outras atividades. Com ela poder-se-ia produzir blocos, manilhas, tubos,  pisos , e o rejeito não ficaria acumulado nas alturas de forma sempre ameaçadora. O terreno revolvido pela mineração e depois desertificado, pode ser recuperado. Na Austrália, na Europa, nos  Estados Unidos, em países onde a VALE opera, esses procedimentos são adotados.  As Agencias, os órgãos ambientais, o Ministério Público, foram omissos ou condescendentes, e a VALE, sempre fez o que quis. Aqui em Sergipe a VALE  há mais de  trinta anos despeja  no mar  os rejeitos da mina de potássio Taquarí- Vassouras. Os sais poderiam ser aproveitados por indústrias químicas, principalmente o cloreto de sódio,  mas a VALE nunca  se preocupou com isso, preferindo a alternativa mais fácil e barata, todavia poluente e anti-social.

AS LEMBRANÇAS DE MURILO MELLINS



AS LEMBRANÇAS DE
 MURILO MELLINS
 Neste começo de janeiro o memorialista Murilo Mellins anda um tanto triste. Lembra-se do aniversário que faria dia 3 o amigo Decinho, sempre   comemorado com muito uísque, apesar do dinheiro escasso. O scotch era falsificado, caseiro, e colocado em garrafas de Old Parr   através de um sistema engenhoso  que Nelson de Rubina, especialista em todas as tramóias, ensinava a fazer.  As ressacas eram demolidoras.
Murilo, para vencer a tendência depressiva que os Natais despertam, vai rememorando casos e  alinha episódios relacionados ao ridículo moralismo da província subjugada pela hipocrisia. Dois deles :
 A empresária da moda Dona Vivinha, tinha uma ¨maison ¨que levava o seu nome, e era freqüentada pela granfinagem com dinheiro, ou fingindo que o tinha. Havia um único modelo de maiô, era discretíssimo, inteiro, e com um saiote que descia até a metade das coxas  . Junto estava escrito: Traje de banho permitido pela Ação Católica.
Esperava-se com muita ansiedade, naturalmente entre os homens,  o anunciado espetáculo da performática vedete Luz Del Fuego. Ela exibia-se nua, tendo a envolvê-la uma jibóia que lhe cobria o sexo, enrolando-se pelas coxas e subindo por entre os seios. Com essa jibóia Luz Del Fuego fazia uma coreografia sensual, a maior ousadia da época, tolerada em alguns palcos do Rio e São Paulo.
O espetáculo em Aracaju era um desafio às normas  conveniências e fingimentos vigentes. Seria no Cinema Rex,  na rua Itabaianinha, local hoje da agencia central do Banco do Nordeste. No dia , formou-se, com antecedência de horas,  enorme fila de marmanjos excitados.   Aparece então o Chefe de Polícia, professor Monteirinho, para comunicar, até contristado, que, a pedido do Arcebispo o espetáculo fora vetado pela polícia. No mesmo instante passa em frente o automóvel Ford, preto, dirigido pelo  Arcebispo, que viera observar se a ordem estava sendo cumprida. Recebeu uma vaia estrepitosa e saiu cantando pneus.

O SENADOR AMORIM E O IMPEACHMENT



O SENADOR AMORIM
E O  IMPEACHMENT
O senador  Amorim   foi até bastante afirmativo ao defender, convictamente, o impeachment da presidente Dilma. Os seus zelosos e pontuais marqueteiros devem  ter-lhe recomendado o novo discurso,  tentativa de marcar  posição política  oportuna para as circunstancias. Até recentemente o senador era prestigiadíssimo no governo central. Ainda mantém posições na esfera federal, mas o seu tempo áureo de governista  foi quando seu irmão e indutor,  Edivan, dizia-se petista prestigiado em Minas , onde alardeava ter dado muito dinheiro para eleger prefeitos e um deputado  federal do PT, que ele trazia sempre a Aracaju para exibi-lo como troféu . Nesse tempo, o senador Amorim usou o peso do cargo e transferiu para ser  Superintendente do Banco do Nordeste em Sergipe, o gerente de uma agencia em Janaúba ( MG) , onde o irmão conseguira  vultoso  empréstimo, aliás nunca pago. Aqui, o Superintendente do BNB liberou empréstimos  para os indicados pelo grupo político do senador, isso em ano eleitoral.  O senador  perdeu o controle do DENIT em Sergipe,  e deve ter entendido que para o seu grupo, o impeachment é a melhor solução. O senador  Amorim recebeu recentemente  de um desses  ¨ institutos de pesquisas ¨  a surpreendente comunicação:  Era o senador mais influente do Brasil.
  Ele acreditou,  e espalhou eufórico, out-doors  por todos os cantos de Sergipe, divulgando a ¨conquista ¨.