sábado, 11 de julho de 2015

GRANDE BOCÃO QUE SAUDADE DO SEU MEGAFONE

GRANDE BOCÃO  QUE SAUDADE DO SEU MEGAFONE
O regime militar  dava sinais de exaustão, e Rosalvo Alexandre, um jovem agronomo que dele era vítima, corajosamente, queria ajudar a apressar-lhe a agonia. Pegou um megafone e saiu pelas ruas de Aracaju, denunciando a falta de liberdade, o processo espúrio da escolha  pelos generais, dos que comandavam a  militarizada República. Rosalvo,  impetuoso, desafiador, clamava por democracia. Aquele gesto foi emblemático para disseminar atitudes corajosas, para afastar o medo opressivo que gerava  a acomodação no silêncio. Rosalvo, com sua voz tonitroante, já era conhecido como o Bocão. Elegeu-se vereador, e desde então o Bocão faria parte indelével do cenário político sergipano. Ideólogo, tambem ideologizador, ele não tinha o ranço da presunção de posse da verdade.  Quando estudante, filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro, que sobrevivia na ilegalidade, e assistindo os seus quadros serem dizimados pela repressão. Dizimados, literalmente. Mortos, assassinados.
Rosalvo mergulhou nas leituras dos livros essenciais ao seu curso de agronomia, e foi alargar o pensamento na literatura marxista, nas ciencias sociais de forma mais ampla. Naquele tempo onde a polarização ideológica era inevitável, ele chegou a ter um vezo estalinista, a concepção dura da esquerda, mas essa tendencia paradoxalmente desapareceu,  quando ele próprio sentiu na pele o que era o descontrole da força bruta do autoritarismo. Estava no seu quarto de pensão em Viçosa, (MG) fazendo um curso de pós-graduação, quando entram militares e policiais que lhe dão ordem de prisão, e imediatamente começam a espancá-lo, furiosos, descontrolados. Trazido a Aracaju, Rosalvo foi levado aos porões do 28 BC ,  que se tornaram o cenário desumano da Operação Cajueiro, em 1976. Saiu da prisão  com a certeza de que só a democracia ampla, poderia ser o caminho para a  superação dos conflitos e as transformações sociais. Mudou conscientemente de estilo, sem  trocar de convicções. Surgiu o Rosalvo conciliador, conselheiro, pensador do presente e de coisas futuras. Surgiu a pessoa essencial nos instantes em que mais era necessário meditar, planejar, e fazer. Consolidou-se o cérebro essencialmente politico. E política é exatamente isso : a arte de superar e de fazer o possivel, sem fugir  ao risco do impossivel.
O colega Rosalvo, fica na memoria dos que com ele sentaram nos bancos escolares, o colega Rosalvo fica na memoria dos que com ele, já  investidos de responsabilidade administrativa e política
  trabalharam na formulação de politicas publicas para Sergipe. Fica Rosalvo na memoria de todos os seus inumeros amigos que com ele partilharam esperanças,  tantas vezes percorridas em vastas jornadas etilicas e boemias. Fica Rosalvo na lembrança do carinho do pai que sempre sentirão os seus filhos, e pelo amor que devotou à última companheira. Fica Rosalvo como lembrança do exemplo virtuoso e puro de cidadania que ele deu a todos nós, sergipanos, todos nós, seus contemporaneos de sonhos e tambem de eventuais desatinos.
 Sergipe sentirá a sua falta. Jackson  Barreto, sentirá talvez mais do que todos a ausencia daquela voz que, nos ultimos meses de vida, insistia em se fazer ouvida, vencendo as limitações da doença para lhe trazer sugestões, ideias, até consolos.
Fica a lembrança do megafone rebelde multiplicando o vozeirão humano-cívico-revolucionário do  suave turbulento Bocão.

 Ele morreu ontem em Minas Gerais onde tentava vencer a doença. Estas páginas neste domingo ficam, assim, incompletas.

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