O gaúcho Irineu Evangelista de Souza, agraciado depois pelo Império com o título de Barão de Mauá, tornou-se, no século dezenove, aquilo que Eike Batista hoje almeja ser: foi, individualmente, o homem mais rico do mundo. Ele fez uma multinacional brasileira. No Império escravocrata, plantador de café e cana, a desgraça de Mauá foi ter feito um palácio mais imponente do que aquele onde residia Dom Pedro II, e, pior ainda: começando a primeira ferrovia do país, ofereceu a Dom Pedro uma pá para que ele simbolicamente desse início às obras. A aristocracia arrepiou-se. Num país onde trabalho físico era uma ignominia a ser suportada pelo braço escravo, um personagem real segurar uma pá soava como deliberada ofensa à superioridade da realeza. A má vontade do Imperador que aplaudia a modernidade lá fora, nas suas constantes viagens, e aqui possuía escravos, juntou-se ao ódio da nobreza parasita e dos grandes fazendeiros retrógrados. Mauá, quase falido, foi refugiar-se no Uruguay, com o que lhe restou da gigantesca fortuna. Frustrava-se, com um século de atraso, uma tentativa brasileira de emular a Revolução Industrial iniciada na Inglaterra .
Delmiro Gouveia, nordestino visionário, comportamento cosmopolita, saído da tropa de burro e do comércio do couro, entendeu que a fartura do algodão deveria ser aproveitada por indústrias brasileiras, desafiando o monopólio colonialista inglês. Fez uma cidade, fez um parque industrial, uma ferrovia, instalou uma hidrelétrica, antecipando Paulo Afonso, construiu vilas operárias, com escolas, postos de saúde, água encanada, luz elétrica e esgoto, isso no inicio do século vinte. Foi assassinado, e até hoje não se sabe se pela fúria do marido de uma sertaneja exuberante, ou vítima de trama criminosa urdida pelo truste inglês, numa reedição das velhas práticas dos flibusteiros, agraciados bandoleiros navegadores a serviço de Sua Majestade Britânica.
Desabava outra tentativa de consolidação da incipiente indústria nacional e, principalmente, da industrialização e modernização do nordeste.
Eike Batista, com arrojo e obstinação, montou um império. Tem sido inovador, enxergando longe, confrontando o hábito letárgico de empresários atrelados aos favores oficiais. Quando os seus variados projetos começarem a produzir, ele alcançará a meta de ser o primeiro no disputado ranking da revista Forbes, que faz anualmente a relação dos mais ricos do mundo.
Pierre Joseph Proudhon, pensador anarquista que inspirou tantos militantes da causa para explodirem reis, nobres e plutocratas, dizia que a origem de toda propriedade é o roubo. Sem que cheguemos a tanto extremismo, não é difícil identificar erros, comportamentos indevidos, em tantos que se tornaram excessivamente ricos. De Mauá, sabe-se que acumulou capital como intermediário do tráfico de escravos, coisa então corriqueira no Brasil, como hoje é a atividade de proxeneta em Brasília; sobre Delmiro, lança-se suspeita de não ter escapado de um dos vícios do coronelismo: a violência. De Eike, sabe-se agora, que além da egolatria desmesurada, tem uma privilegiada cabeça cheia de espertezas inteligentes para a dura competição empresarial, e, na mesma proporção, vazia de sentimentos humanos.
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