quinta-feira, 3 de novembro de 2011

A ATALAIA SEUS PROBLEMAS E O PLANO DIRETOR

 Um aglomerado de pescadores que surgiu nas proximidades do primeiro farol de bandeiras, ou atalaia,   na margem direita do estuário do Sergipe, gerou o topônimo Atalaia Velha. Veranistas de Aracaju vieram juntar-se aos pescadores construindo casas rústicas.  Mas não havia estradas. Em 37 o interventor Eronildes Carvalho concluiu a ponte sobre o Poxim e tornou trafegável, por veículos, um precário caminho. A ponte foi  prodígio de péssima engenharia. Fazia  curva alta sobre o rio para que, sob o  vão central, pudessem passar os saveiros . A  povoação  sempre aumentava um pouco no verão.  Logo, ter casa na Atalaia passou a ser diferencial de status social, algo assim como mais recentemente aconteceu com a praia do Saco. Naquele tempo,  contudo, as casas dos ricos, ou dos que assim se imaginavam, eram choupanas, se comparadas com o padrão da praia estanciana.  O interventor quis imitar os hábitos do ditador Getúlio Vargas que durante o verão mudava-se do  Catete, no Rio, para o palácio Rio Negro em Petrópolis,  então, foi construído o palácio de veraneio da Atalaia. Construção exótica para os trópicos,   resultado da prancheta não aclimatada de um arquiteto europeu que por aqui andou. O palácio tinha os telhados laterais formando um ângulo agudo com a cumeeira. Se  depois de um cataclismo climático viermos a ter nevascas, o telhado palaciano cumprirá o seu papel.  A ponte, aquele desastrado semicírculo,   mal completou 10 anos  já apresentava imensas rachaduras.   Na década de 50 o  problema agravou-se, dizia-se que a ponte poderia cair a qualquer momento.  Por segurança os motoristas das   ¨marinettes¨  chegando   ao pé da ponte paravam o veiculo e mandavam   os passageiros  descerem .  As pessoas   caminhavam sobre a perigosa  armação, e   quando  já estavam na parte mais alta, olhando pelas rachaduras o rio lá embaixo,  tinham de apertar-se todas,  ao lado, para que a marinette  passasse  resfolegante pela pista escassa que só permitia um veiculo.   Com todo o respeito pelos irmãos lusos, um bom motivo para piada de português. Leandro Maciel, (1955-1959) que era da UDN, asfaltou em 1957 a estrada;  com verba federal construiu a nova ponte, gerando um quiproquó  político sobre a paternidade da obra, que fez o presidente  Juscelino  inventar um pretexto para retornar ao Rio de Janeiro rapidamente, dando por inaugurada a construção e desculpando-se por não ir à recepção preparada em palácio.   Deixou assim   muito satisfeitos  os seus correligionários do PSD .  Leandro foi  mais  além  no seu projeto de valorização da Atalaia, e construiu o Balneário,  prédio acanhado que, estranhamente, não tinha vista para o mar, mas, começou a atrair a sociedade aracajuana para o caranguejo com cerveja depois da praia nas manhãs de domingo, ou um jantar mais requintado durante a semana.  Isso provocou uma rachadura social mais acentuada. Pobres, vindos nas ¨marinettes¨ aos domingos dirigiam-se para o lado esquerdo, do outro lado do que é hoje a Avenida Rotary, onde fica o Hotel Beira Mar. Lá,  juntavam-se  prostitutas e boêmios tresnoitados,  tendo como base o   bar de Paulo Milachula.  Depois, tudo se foi misturando, e o Balneário, à direita,  recebeu  a fauna festiva e descontraída da outra margem da rua. Murilo Mellins  nosso memorialista maior, poderá contar tudo isso com detalhadas minúcias, ele, que foi frequentador assíduo, observador atento, daquelas duas bandas da Atalaia.
  Quando JK inaugurou a ponte,  já estava pronta  a pista do aeroporto Santa Maria, nos fundos da Atalaia, mas, faltava uma estação de passageiros.  Ela só veio a ser concluída em 1962 no governo de Luiz Garcia (59-62).
O crescimento populacional da Atalaia  foi acontecendo lentamente. Nos fins dos anos 60, Lourival Baptista,  ( 67-70) num golpe de muita esperteza política trouxe para  Aracaju a Petrobrás Nordeste, ai, o salto urbano da capital estendeu-se mais fortemente pelo bairro praiano. Eram centenas de famílias de alto poder aquisitivo chegando. A descoberta do petróleo no mar, bem em frente à Atalaia, aumentou o fluxo.  Então, a orla já tinha uma larga avenida asfaltada.  A noite  começava a fervilhar. Luiz Adelmo, jornalista e  marchand, transformou-se em bar- man  e instalou o Barracão, palco de grandes noitadas. Paulo Barreto (71-75), com visão futurista duplicou a estrada, fez nova ponte paralela à primeira.  A Atalaia ganhou água encanada ,  telefone,  transportes  razoáveis.  Veio o primeiro hotel, o Beira- Mar,  dos sócios  Valteno Menezes, João Alves Filho, Viana de Assis.  Houve apoio da nascente EMSETUR, que teve como primeiro presidente Carlos Magalhães. O odonto-radialista e professor, apostou  no turismo quando, por aqui, a palavra ainda era  quase uma ofensa.  Dizia-se de alguém que não queria nada: é um turista.
João Alves, quando prefeito, ( 75-79) foi arrojado,  iniciou a Coroa do Meio, fez outra ponte sobre o Poxim.   A Atalaia  ganhava uma dimensão que  exigiu a subdivisão em novos bairros.
Valadares  (87-91) fez o calçadão da Atalaia.  O presidente Collor veio inaugurar, e nele passeou montado numa bicicleta.
Albano fez a passarela do caranguejo, ampliou a área de lazer.
João Alves no terceiro mandato, ( 2003-2007) deixou pronta a Orla, excelente área de lazer, atração turística, cartão postal. Zelosamente cuidada por Déda, que o sucedeu.
Marcelo Déda,  sem se deixar contaminar pela norma excludente de estabelecer locais definidos para pobres e ricos, quando foi prefeito ( 2000-2007) transformou um gueto de miseráveis  vivendo sobre a lama, num local decente para se viver. A Atalaia  viu desaparecer sua única favela, bem ao lado de confortáveis residências. Agora, Edvaldo Nogueira estende asfalto por todas as ruas do bairro, faz obras para evitar  inundações.
 Os  problemas de um bairro que cresceu demasiadamente parecem aumentar   na mesma rapidez com que se estabelece um processo de conurbação,  espécie de moderna degradação urbana. O bairro adensou-se e não há áreas verdes. Acabaram com o limite de quatro andares e não estabeleceram um gabarito máximo. Os prédios se multiplicam, os condomínios,  a recente  moda  dos apartamentos compactos,  tudo faz crescer o numero de pessoas em espaços cada vez mais restritos. A Atalaia é deficiente em esgotamento pluvial e sanitário, agora, estão ligando diretamente os esgotos à rede pluvial, e a podridão se espalha,  inclusive próxima aos hotéis.
Há exemplos deploráveis de degradação de bairros praianos e de cidades balneários, locais de atração turística   transformados em verdadeiras calamidades, em tragédias urbanas. Iniciemos por Copacabana, onde, a partir dos anos 20 se começou  a fazer uma parede de edifícios, uns colados aos outros, ao longo da Avenida Atlantica.  O resultado dessa imprevidência é um calor que chega a mais de 45 graus nas ruas, atrás da muralha de cimento    que impede a circulação do vento  soprando do mar.    No Pina,  Boa Viagem, em Piedade, praias do Recife onde  há edifícios com mais de trinta andares, acontece algo semelhante a Copacabana. Camboriú, em Santa  Catarina, local preferido pelos turistas argentinos, uruguaios, a qualidade de vida na cidade despenca. Na praia, depois das treze horas, a sombra dos edifícios se projeta e o sol desaparece.
Os vereadores que  estão às voltas com o Plano Diretor de Aracaju, e até tiveram a boa iniciativa de fazer reuniões públicas para que a comunidade participe, precisam evitar que acabe  consumada, na Atalaia,  a mesma desgraça urbana ocorrida em tantos outros locais, e  agora, começa a se configurar naquele bairro aracajuano que poderia ser o nosso valorizado cartão postal.

 A LONGEVIDADE E
A ARTE DE VIVER

Daqui a meio século, talvez menos, completar 90 anos não será  nenhuma façanha de longevidade. Os seres humanos estão aumentando cada vez mais o seu tempo de existência e melhorando a qualidade de vida, pelo menos, aqueles que não tiveram a desventura de nascer nas regiões miseráveis do planeta. Senectude está deixando de ser palavra que lembra enfraquecimento, perda da maioria das funções, e um quase alheamento, pelo idoso, daquilo que se passa em torno dele.
Os gregos que cultivavam o ideal do corpo e mente funcionando de forma harmônica, entendiam  a velhice como o tempo da sabedoria. Vários outros povos também, inclusive os nossos índios.
 Ser idoso não é necessariamente ser sábio,  a sabedoria da senectude resulta, essencialmente, da forma como as pessoas atravessam a existência, ou seja,  da arte de viver.
Na verdade são poucas as pessoas que se dedicam ao essencial da arte de viver, que consiste na busca do conhecimento e da paz, na capacidade de ser solidário, no interesse pelo mundo e pelo humano, e na dignidade para enfrentar também a luta e a adversidade, evidentemente, sem perder jamais a sintonia com a ternura, como recomendou um guerrilheiro e sonhador exemplar, Che Guevara.
Aos 90 anos feitos dia dezesseis último, sem festa, como ele preferiu, o desembargador Antonio Xavier de Assis Junior, é, o que se poderia chamar  de mestre na arte de viver, e, mais ainda, um mestre que transmitiu a própria arte a discípulos diletos, como o  advogado , conselheiro do Tribunal de Contas, Carlos Pinna de Assis, culto, refinado, atuante, e o engenheiro civil Antonio  Pinna de Assis,  filhos do seu casamento com  Amália Pinna de Assis, já falecida.
O desembargador Xavier de Assis em plena atividade física e intelectual, é  assíduo integrante do Conselho Fiscal do BANESE e presidente do Conselho Fiscal da Associação dos Magistrados.
Ele aposentou-se em 1980, mas, convicto de que a boa arte da vida exige, entre outras coisas, a presença e a participação intensas na cena pública, entendidas como prestação de serviço, foi também, por 4 anos, Procurador Geral do Estado nos governos de Augusto Franco e Djenal Tavares de Queiroz.
O Juiz Ricardo Múcio  de Abreu que tem sido feliz em tantas outras iniciativas, como presidente da AMASE resolveu criar uma comenda, e a ela, com muita justiça,  denominou Medalha Desembargador Antonio  Xavier de Assis Junior.

 ( PUBLICADO ORIGINALMENTE EM 19/2/2001 NO JORNAL DA CIDADE, E REPRODUZIDO AGORA COMO HOMENAGEM AO CENTENÁRIO DO SAUDOSO DESEMBARGADOR)

A COMIDA  PARA ALGUNS  INDIGESTA

Lembra o advogado Luiz Eduardo Ayres Britto de um episódio que lhe foi contado pelo seu irmão, o Ministro do Supremo Tribunal Federal Carlos Ayres de Britto.
 No segundo governo do engenheiro Jose Rolemberg  Leite, um prefeito do interior muito conhecido e  maneiroso, também cercado por  fama nada recomendável, foi ao palácio para convidar o governador a comparecer à festa da padroeira do município. Insistiu  muito , disse que o povo ficaria ressentido se o governador não comparecesse.  Jose Leite aquiesceu, prometeu-lhe que iria.
 No dia, convidou Carlos Britto,   Procurador Geral do  Estado a acompanhá-lo. E lá se foram os dois.  Depois da procissão, da missa que se alongou até às oito da noite, o prefeito  os convidou para que fossem à sua  casa jantar. Aceito o convite, casa cheia, centenas de pessoas, mesa farta e muita bebida rolando, o prefeito, que estava na mesma mesa do governador e do procurador, faz sinal para um homem que passava por perto. Ele chega e o prefeito sorridente, com um  certo ar de esperteza e cinismo, o apresenta: ¨ Governador, Dr. Carlos Britto, este aqui é o meu contador ,  homem muito competente, ele é quem faz essa arrumação com o dinheiro, para mostrar ao Tribunal de Contas,  por isso, sempre sobra alguma coisa  para fazer festas, um jantar  como este, para tanta gente¨. 
Jose Leite sem mudar o tom manso de voz que sempre tinha, disse: ¨ Me  desculpe prefeito, lembrei-me de que tenho um compromisso agora em Aracaju e preciso voltar. Vamos Dr. Carlos ¨.
No caminho de volta o governador apenas fez um comentário: ¨Dr. Carlos, aquele jantar ia ser indigesto¨.
O MILHO FARTO PARA O NOSSO CUSCUZ
 Faz aproximadamente 40 anos, havia em Aracaju dois moinhos, o Garça,  e o Globo. Trabalhavam principalmente com o milho,  produzindo a massa usada na preparação do cuscuz. Mas o milho ,  insumo básico daquelas indústrias, era comprado fora. Vinha  do  Paraná, de   São Paulo. O milho sergipano colhido em pequenas roças, era,  na sua maior parte, consumido verde durante os festejos juninos. Transformava-se em canjica,  pamonhas, bolos, manauês, ou oferecido assado,  cozido. Pouco sobrava das espigas secas, além daquelas reservadas para as  galinhas ,  porcos e cavalos,   a fim de serem levadas às industrias.
 A produção de milho  sempre foi  irrelevante em Sergipe, cultura praticada apenas por agricultores empobrecidos.  A produtividade  vergonhosamente baixa era o que se podia conseguir. Utilizavam –se  sementes de baixa qualidade, ignorando-se o que fosse adubação e técnicas de plantio. Além do mais, o tempo requerido entre o semear e o colher, quase afastava do semiárido a possibilidade de  sucesso na plantação do milho, em virtude do curto período em que, ali, as chuvas costumam ser mais constantes. O milho era o cultivo mais vulnerável às estiagens. Essa conjuntura desfavorável foi aos poucos sendo transformada. As pesquisas da EMBRAPA tornaram possível uma planta  com ciclo menor de maturação,  mais produtiva  e resistente à estiagens. Alguns produtores   capitalizados,  começaram a beneficiar-se do que a tecnologia oferecia;  utilizaram sementes selecionadas, mecanizaram a lavoura, adotaram técnicas modernas de plantio, usaram intensivamente os fertilizantes, também, o infelizmente inevitável agrotóxico, ou , se preferem, defensivo agrícola, e foram alcançando os primeiros bons resultados.
 Em 2000 a produção de milho alcançou, em Sergipe,  irrisórias 86.931 toneladas. Houve um lento acréscimo durante 4 anos e, em 2006, chegou-se a 184.908 toneladas.
A partir de 2007, ao que tudo leva a crer, como resultado de uma virtuosa somação da agricultura familiar, ampliada exatamente em função da reforma agrária, com agricultores de maior porte, que se tornaram mais numerosos, ocorre então,   vertiginoso crescimento, uma exponencial dança de cifras  representando o dobro da produção,  entre 2007  e 2008, exatamente quando entram em cena as políticas públicas de estímulo à agricultura familiar, se expande o crédito, e se estabelecem garantias de preços mínimos. As cifras saltam de 237.129  em 2007, para 584.786 toneladas no ano seguinte.  De 2008 a 2009 há um crescimento de quase 30%,  e Sergipe exibe uma produção de  703.294 toneladas.   Chega em 2009,  dando  salto superior a 30%,    um número que no nordeste é inédito, a não ser em  Sergipe e Bahia, algo além de um milhão de toneladas,  exatamente,  1.055.166. A Bahia, primeiro produtor do nordeste, alcança produção que é um pouco mais do que o dobro da sergipana. A Bahia  tem ,  todavia, e é bom ressaltar, uma área agricultável vinte vezes maior do que a  de Sergipe.   Sergipe tem apenas 22 mil quilômetros quadrados de área, por isso, é possível que sejamos, agora, em termos relativos,  o maior produtor de milho do Brasil. O Maranhão, terceiro  produtor nordestino, chegou,  ano passado, a somente  pouco mais da metade da produção sergipana.
De 2007 a 2010, a safra sergipana de milho foi multiplicada quase cinco vezes, um recorde não igualado no Brasil por qualquer outro tipo de cultura, a não ser  soja, ou a cana nos tempos eufóricos das facilidades do Proálcool.
As causas do sucesso devem ser, fria,   objetivamente analisadas. Houve uma boa sequencia no desenrolar de políticas públicas voltadas para o setor rural,  refletidas positivamente na ascensão do milho.
 A reforma agrária  fortalecida com mais desapropriações e pagamento aos proprietários das terras. O apoio ao assentado,  incrementado com ações dirigidas à agricultura familiar, abrindo para os pequenos agricultores acesso ao crédito, levando a eles a mecanização, as sementes, as inovações nas técnicas de plantio. Um programa deve ser especialmente destacado: a produção de sementes selecionadas de milho no Projeto Califórnia, em Canindé do São  Francisco. Com isso, houve a garantia da entrega da semente de boa qualidade no tempo certo ao agricultor, também, um crescimento na renda dos irrigantes do perímetro sertanejo. Por sua vez, os maiores produtores aprimoraram o agronegócio, a ele agregando tecnologia,  com  acesso mais fácil ao crédito e garantia de mercado.
Romperam-se assim dois preconceitos: o primeiro deles contra a reforma agrária,  alimentado pelo excesso de conservadorismo e ódio irracional ao MST;  o segundo, a aversão ao agronegócio, estimulada por uma visão equivocada de parte da  esquerda, que ainda abjura o lucro, sem o qual nenhuma economia anda, seja ela estatizada, privada, coletivizada, ou baseada nas visões utópicas dos falanstérios.
Na realidade, pequenos agricultores bem sucedidos, são  exemplos  de agronegócio que é, muito mais, um conceito técnico de produção, do que uma exigência de amplitude de terras e fartura de capital.
Em Sergipe, deu-se então a  proveitosa  junção do médio e do pequeno agronegócio, num esforço comum pela boa utilização da terra, o que se traduz em produtividade. Agora, o essencial é racionalizar cada vez mais o cultivo, tornando-o sustentável  com o  uso equilibrado dos defensivos e fertilizantes, o trato da terra onde se planta, e do meio que a circunda, como patrimônio preservado, socialmente útil,  hoje, e das gerações que virão.  Assim, Sergipe produzirá mais, e dando bons exemplos.
Este ano, em consequência da estiagem em algumas regiões, a produção poderá sofrer  variação para baixo em torno de dez por cento. Mas, há quem garanta que  acréscimos na produtividade poderão compensar a perda .
Teremos milho de sobra para o nosso cuscuz.
CALOTE A AGIOTAS MATA OU SALVA
 Um cidadão endividado,  perseguido por agiotas e que neles vier a dar um calote, corre sério risco de ¨ir estudar a geologia dos campos santos ¨.  Mas há também o inverso, ou seja,  o caso em que os agiotas, irrefletidos nos seus empréstimos arriscados a gente perigosa, terminam  sendo  vítimas do calote violento dos seus devedores. Quando se trata de países devedores e seus credores, os bancos, o enredo da agiotagem é semelhante. Os bancos credores, ou agiotas ,   dá no mesmo, recebem, invariavelmente, o apoio institucional dos seus países, que tantas vezes descambou para guerras de agressão. A Inglaterra vitoriana,  era contumaz na movimentação da sua esquadra para cobrar dívidas com os canhões disparando. Os Estados Unidos tantas vezes fez o mesmo. Desse procedimento, quase não escapa nenhuma das chamadas grandes potencias.
Quando Juscelino Kubitschek resolveu dar um chega prá   lá no FMI, cobrador exigente da agiotagem financeira internacional, e ameaçou com uma moratória, teve o cuidado de procurar pelo mundo investidores, e dizer-lhes que no Brasil poderiam ganhar muito dinheiro, se aqui instalassem fábricas de automóveis, siderúrgicas, estaleiros, oferecessem mais crédito para tantos projetos de infraestrutura, que, em última análise, iriam garantir o sucesso dos seus investimentos.  Caso houvesse baixado a cabeça para a agiotagem internacional o Brasil teria sido sufocado, e não seria possível o cumprimento da meta desenvolvimentista dos 50  anos em 5.
Nestor Kirchner encontrou uma Argentina  em frangalhos, a classe média quase esmolando nas ruas, e sentiu que se atendesse aos bancos o país não sairia do fundo do poço. Decretou a moratória, dilatou unilateralmente os prazos da dívida, negou-se a pagar juros escorchantes e foi soerguendo a economia, saldando  a dívida da forma que era possível. Se não fizesse o que fez, seria mais um dos presidentes  fracassados que mergulharam no limbo da história. O  cassino financeiro internacional reagiu indignado, a grande mídia com ele fez eco de repetida concordância, mas, como não existiam  condições objetivas para as tradicionais cobranças violentas, conformou-se,  tendo de atualizar para um pouco menos as suas expectativas de lucro.
Agora, a Grécia  falida aplica um calote nos bancos, deixando a eles metade do rombo da dívida externa.  A irresponsabilidade, o aventureirismo ganancioso, não foi procedimento exclusivo de governos  gregos, como não é, também, dos
 governantes  de Portugal, da Espanha, da Itália, da Irlanda, igualmente falidos, dos Estados Unidos, quase no mesmo time dos insolventes.
Os bancos, principais agentes do cassino financeiro global, são os maiores responsáveis pela crise. Por isso, o calote da Grécia nem chegou a assustar ou indignar os chefes de governo do ainda chamado primeiro mundo.   Eles poderão admitir publicamente ou não,  tanto Obama, como Sarkozy, Angela  Merkel, David Cameron, possivelmente até o gangster Berlusconi, já identificam os bancos como os maiores vilões dessa sucessão de fracassos. Se   haverá neles, capacidade, coragem, ou dignidade para tentarem mudar o comportamento do monstro financeiro global, aí, já é outra estória.

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