DE FATO E DE FICÇÃO
Chegamos
a uma fronteira onde o fato e a ficção
se misturam. E o fazem de tal forma, e o fazem tão rápido, que nem tivemos tempo ainda de parar, e sobretudo
de refletir.
Quando
acabou o ano 1984, dissemos: Olha ai não aconteceu. Onde está o Grande Irmão, o
Big Brother, poderoso, envolvido naquela bruma de mistérios que separa todos os
ditadores da gente comum, que os afastam
até do mundo real ?
Onde
estão as câmeras intrometidas, fiscalizando
todos em todos os lugares ?
Onde
estão os agentes do Estado se imiscuindo
na vida, monitorando os passos e o pensamento das pessoas ?
No réveillon de 1985, o ano que findava não
confirmou a previsão sinistra feita pelo escritor George Orwell no livro a que
deu o título sintético e numeral: 1984. Naquele ano, segundo a futurologia
orweliana , o mundo seria uma espécie de
prisão virtual, onde o Big Brother estaria presente, atento, vigilante, estendendo
vistas e ouvidos por todas as casas, apartamentos, fábricas, escolas, ruas,
estradas, campos, utilizando-se dos recursos ilimitados da tecnologia, da
ciência posta a serviço da dominação da
humanidade.
George
Orwell escreveu suas previsões aterradoras pouco depois de combater, como
voluntário, nas tropas anti-fascistas, derrotadas na Guerra Civil
Espanhola. O mundo caminhava para a
Segunda Grande Guerra e ele assistia amedrontado a ascensão dos estados totalitários. O escritor morreu cedo,
aos 47 anos em 1950, e nem pode confirmar ou desmentir o que houvera
previsto. Ele nem imaginaria que o seu
Big Brother seria transformado num show de sacanagens: o cabaré virtual onde o
sexo vira mercadoria, na engrenagem capitalista que Orwell detestava.
Sem
exageros agora podemos afirmar: 1984
está ai, presente agora três décadas depois.
Mergulhamos
no mundo virtual. E ele é perigoso. Se não temos ainda o Big Brother , estamos
em vias de criar um Estado policialesco, estimulado pelo pavor que espalham os
terroristas, pelo calafrio que perpassa as espinhas dos poderosos do mundo,
sentindo que são vulneráveis a um hacker qualquer, instalado longe, no terceiro
mundo em alguma favela imunda de
Bangladesh ou do Burundi.
As
pessoas há muito tempo deixaram
conversar vendo uma o olho da outra. Apenas digitam, olham as telinhas.
Quando aqui no Brasil a delação premiada tornou-se moda, ou modismo, veio com
ela a banalização da escuta telefônica como arma da policia e da Justiça. Só
que esses instrumentos de intromissão não ficam sobre o controle da sociedade,
são restritos os que a ele têm acesso.
Em qualquer ¨cacete- armado¨
vendendo buginganga chinesa se compra
aparato eletrônico de espionagem e
invasão.
E
de tanto banalizar o que antes seria inadmissivel, que é a violação pelo Estado
ou por quem quer que seja da intimidade e da inviolabilidade do pensamento e
das manifestações das pessoas, agora,
qualquer canalha pode tirar proveito da molecagem eletrônica e com ela
tornar-se um herói delator.
É,
embora tardiamente , o Big Brother de Orwell chegou, está entre nós, e causando
estragos. A ele ficamos todos submetidos e inertes.
O
Big Brother, depois, faz acordos de leniência e vai morar em Itaipava .
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