OS MANDATOS DEVOLVIDOS
E UMA NECESARIA RESSALVA
Já demorava muito o
necessário ato de reparação aos que o golpe militar puniu em Sergipe. O primeiro
de todos, na simbólica homenagem, não poderia deixar de ser o governador
Seixas Dória, retirado do Palácio e
levado preso a Salvador na madrugada de
2 de abril de 1964.
Os deputados que logo depois perderam os
mandatos cassados pela Assembléia, cujo prédio estava cercado por tropas do
exército, foram: Viana de Assis , Baltazar Santos e Antonio Oliveira. Armando Domingues foi cassado em 1947, no governo
do marechal Eurico Dutra, quando , extinto o PCB, em seguida começou a cassação dos seus representantes nos parlamentos. Na Assembléia , em 64, a única voz a levantar-se corajosa contra o
arbítrio foi a do deputado Viana de Assis. Saiu preso. Também foi devolvido o
mandato ao deputado Cleto Maia, como os
demais, já falecido. Não se discute a
justiça da devolução, porque todas as cassações
resultaram do arbítrio e foram
injustas e ilegais. Mas, no caso de Cleto, há que se fazer uma observação. Depois de perder o mandato, ele foi morar no
Rio de Janeiro, onde pretendia advogar,
ocupando uma sala quase em ruínas de um velho prédio na rua do Ouvidor. Começou
a praticar atos que mancharam , desgraçadamente, a sua
reputação de profissional e cidadão. O mandato devolvido foi ato justo, mas a memória da
indignidade cometida por Cleto não poderá desaparecer. Sendo advogado e
procurador do engenheiro e professor Carlos
Oliveira, de quem era amigo, e a quem
devia atenções e favores, Cleto falsificou documentos e dilapidou o patrimônio
de quem a ele dera plenos poderes para administrá-lo.
Carlos Oliveira superou as vicissitudes do berço humilde
e tornou-se um graduado funcionário da
UNESCO, com sede em Genebra, isso, depois de ter sido perseguido pelo golpe
militar que o demitiu da Petrobras, afastando-o da chefia dos escritórios da
empresa em Londres e Paris. Vivendo na Europa durante a maior parte da sua vida,
o sergipano capelense, um intelectual que se dedicava também à literatura,
imaginava, ao aposentar-se, voltar a morar na sua terra. Ganhava em dólares e vivia com simplicidade na
Suiça. Com o que poupava ia
adquirindo imóveis no Brasil, ou melhor, imaginava que os adquiria, porque
Cleto, seu procurador, apenas forjava documentos falsos. Carlos , aposentado, retornou ao Brasil. Morreu pouco tempo depois, abatido pela decepção , a angustia e
a revolta, constatando que o ¨amigo¨ o
deixara literalmente na miséria. Cleto aplicou também outro
golpe, maior ainda, sendo vítima o rico
armador sergipano Ariosto Amado, que resolvera ajudar o conterrâneo.
Cleto ,tendo envergonhando
a honrada família que vivia em Sergipe,( era irmão do ex-prefeito de Propriá, o conceituado médico Geraldo Maia) foi
assassinado anos depois, no Paraná, supostamente por pessoas que também
ludibriara.
Todos os personagens desse episódio já estão mortos, mas há
outros, vivos ou mortos, que também foram cassados pelos Atos Institucionais do
poder ¨revolucionário ¨. A todos esses, os mandatos teriam de ser também devolvidos. Quando se faz, não se sabe por
quais critérios, uma seleção daqueles que merecem a reparação, e aos outros não se tem o mesmo tratamento, de
certa forma se pratica idêntico ato de
exceção, admitindo-se, indiretamente,
que uns poderiam ser cassados, outros não, ou seja,
a
legitimação do arbítrio, da ilegalidade.
O projeto de devolução restrita dos
mandatos, incompleto e injusto ,
foi da deputada Ana Lúcia. Caberá à Assembléia corrigir a
injustiça cometida contra deputados democraticamente eleitos, e igualmente afastados dos mandatos de forma
discricionária. Foram eles: Santos
Mendonça, Edson Mendes,e Chico de
Miguel, falecidos, e vivos, Gilton Garcia, Aerton Silva e Rosendo Ribeiro, estes últimos anistiados em 2006, sendo reconhecido que foram vitimas de perseguição
política. Em Sergipe, cada cassação era o triunfo da raiva transformada em futrica bem sucedida.
Diante do que
aconteceu agora , talvez por equívoco dos deputados que apoiaram a proposta da
deputada Ana Lúcia, fica-se sabendo que a mesquinharia política não é um triste
apanágio das ditaduras.
Nenhum comentário:
Postar um comentário