OS MANDATOS NÃO DEVOLVIDOS
A HOMENAGEM QUE NÃO É FEITA
No dia 31 de março deste ano, ou,
se preferirem, no dia primeiro de abril, faz meio século do golpe,
início de uma ditadura que
atravessou várias fases, desde a extrema dureza totalitária após o Ato Institucional
de 13 de dezembro de 68, até uma razoável faixa de liberdade consentida,
nos últimos 6 anos ocupados pelo general-presidente João Baptista Figueiredo, após a abertura ¨lenta e
gradual ¨iniciada pelo general-presidente Ernesto Geisel.
.Nos seus 21 anos de deplorável
existência, o regime autoritário prendeu, cassou mandatos, puniu servidores
públicos civis e militares, perseguiu mesquinhamente adversários, censurou,
policiou a criação artística, deportou brasileiros, também torturou, assassinou, e até instituiu a pena de morte
para crimes de natureza política.
Refeita a democracia, montada a
estrutura do que se pretende ser um Estado Democrático de Direito, o Congresso
Nacional só há pouco tempo tomou a iniciativa de devolver simbolicamente os
mandatos dos parlamentares e dos presidentes da República que foram cassados.
Várias Assembleias e Câmaras de Vereadores tomaram o mesmo caminho em relação a
governadores, deputados, prefeitos e vereadores, vítimas dos atos de exceção punitivos.
Restituir esses mandatos em
cerimonias onde quase sempre só os descendentes das vítimas estão presentes, é a indispensável reparação,
a homenagem à memoria dos que foram castigados sem direito à defesa. Aqui em
Sergipe, apesar das insistentes manifestações feitas por vários deputados,
apesar das repetidas cobranças da deputada Ana Lúcia, a Mesa Diretora da
Assembleia parece insensível ao que ocorre em todo o país, e mantem o
nosso Legislativo numa posição que se
assemelha à conivência, ou plena concordância com os atos que atingiram
diretamente a parlamentares e ao governador Seixas Dória, mas, na realidade,
foram praticados exatamente para que restasse desmoralizado e tornado
subserviente o Poder Legislativo. E foram deputados abatidos pela covardia, ou parceiros conscientes do arbítrio
que se instalava, que obedeceram às determinações do comando militar e cassaram
colegas. Naquele abril de 64 o prédio
antigo da Assembleia estava cercado por 3 pelotões de infantaria, um deles,
vindo de Salvador, e assim começava a ¨democracia¨ inaugurada pelos golpistas.
Do Palácio Olímpio Campos já fora bem antes retirado à força no meio da noite o governador Seixas Dória, também cassado pela Assembleia sob a mira de
fuzis e metralhadoras. Vale lembrar a corajosa defesa do seu mandato e das
prerrogativas democráticas que estavam sendo sepultadas, feita pelo deputado
Viana de Assis, que deixou o prédio da Assembleia preso pelos militares. Depois,
veio a repressão ainda maior, ainda mais descontrolada, em
dezembro de 68. É a todos os perseguidos, é a todos os vitimados pela
truculência do arbítrio, que o
Legislativo sergipano está a dever, em nome do povo, uma reparação simbólica da injustiça, com a devolução dos mandatos que a maioria
das vítimas já não poderá receber. A presidente Angélica Guimarães e todos os integrantes da Mesa, rápidos ao promoverem inovações regimentais
que se tornam agora objeto de análise pela Justiça, estão a dever à consciência
livre e democrática do povo sergipano uma demonstração pública de que foram
nulos todos aqueles atos praticados num tempo em que a força das armas fez disseminar o medo e a subserviência.
As Câmaras de Vereadores estão,
da mesma forma, a dever a adoção de semelhante procedimento. Em Aracaju, há os
dois mandatos de Manoel Vicente e
Agonalto Pacheco que devem ser restituídos às famílias. Em Estancia, a Câmara
precisa marcar o dia da solenidade para entregar ao ex-prefeito e hoje
desembargador aposentado Pascoal Nabuco,
o mandato popular que lhe foi roubado, também, uma reparação pública pela pena
injusta e absurda que o fez penar 9 meses preso num quartel do exército em
Salvador. Há em outros municípios
injustiças que devem ser historicamente corrigidas. Seria uma forma até
pedagógica de, neste ano do cinquentenário do colapso da democracia brasileira,
lembrar de tudo o que aconteceu.
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