sábado, 7 de dezembro de 2013

NOTICIAS DE MANGUE SECO (3)



NOTICIAS DE MANGUE SECO  (3)
 Em Mangue Seco circula uma frota de mais de 30 bugres. Veículos improvisados, de baixo custo,   únicos que podem enfrentar os areais, e subir e descer fazendo ousadas manobras sobre as dunas. Depois da ponte Gilberto Amado o fluxo turístico cresceu na região, convergindo para a Praia do Saco, o Pontal, a Terra Caída, o Porto do Cavalo,  e também beneficiando  o lado baiano do imenso estuário. Com os peixes cada vez mais escassos, os pescadores desistem de redes, linhas e anzóis,  e se tornam  bugreiros,  pilotos de lanchas, ainda o principal meio de transporte para quem queira ter acesso a Mangue Seco. A comunidade  vive  do turismo, e sem  gente suficiente para ocupar os postos de trabalho,  trabalhadores das redondezas  passam o dia nas pousadas e restaurantes,  retornando à noite às suas casas, na sua maior parte no  Coqueiro, um povoado maior  que é , economicamente,  satélite de Mangue Seco.
  Eugênio, entre os bugreiros se destaca:  o seu bugre é novinho em folha, reluzente, bem tratado,   ainda por cima tem um som da melhor qualidade.  No fim do dia quando encerra as atividades  ele chega com o  seu carrinho, que, como todos os bugres,  é aberto,  e o estaciona junto à corrente que atravessa a rua delimitando a área até aonde podem ir veículos motorizados. Um detalhe quase inacreditável: A chave nunca é retirada, fica na ignição , da mesma forma o som,  vistoso componente bem visível no despojado painel.
  Eugênio faz cara de estranheza quando lhe perguntam se não tem medo que lhe roubem o bugre ou o som tão acessível para quem quiser furtá-lo, e logo transforma a estranheza em pergunta ,  seguida da explicação definitiva: ¨E quem aqui iria fazer isso? Em Mangue Seco não tem ladrão. ¨
Regis,   mora em Estância.  Sobrinho de Dona Ana, ele, vez por outra aparece no café da sua tia, um local onde além do expresso cuidadosamente preparado, há doces saborosos feitos com frutas da terra e com o requinte da doceira que, pela morte da mãe, dona Sula, teve de usar o seu talento  tocando o negócio, e   foi viver para sempre  em Mangue Seco. Ela é prima de Jorge Amado. Aos 80 anos lembra-se de quando o escritor andou entre Estancia e Mangue Seco para fugir da polícia política do ditador Getúlio Vargas, que sabia por onde ele andava, mas preferia não prendê-lo, a menos que  retornasse ao Rio de  Janeiro, capital da república, onde,  no entender  da  desinteligência  do aparato repressivo, os comunistas  se tornavam perigosos. Nas lonjuras de praias sergipanas ou baianas, qualquer comunista  ficava inofensivo. Pois bem, voltando ao Regis, sobrinho da dona Ana, ele, vez por outra ,  gosta de sair  andarilhando pelo  povoado.   Regis conta que nessas  caminhadas as vezes resolve dormir em qualquer lugar onde haja um gramado aconchegante, e vai deixando celulares, carteiras, e os esquece. Volta para casa e no outro dia chegam as pessoas para avisá-lo onde estão os seus pertences. Ninguém os toca, preferem avisar ao dono, que tranquilamente vai buscá-los. ( Continua no próximo domingo )

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