sábado, 17 de agosto de 2013

AS FEIRAS LIVRES E OS CHARUTOS DE FIDEL



AS FEIRAS LIVRES E OS CHARUTOS DE FIDEL

Um jornalista sergipano  que gosta de bater perna pelo mundo,  faz mais de  20 anos estava em Cuba.  Fidel, ainda  firme e forte, fumava seus Cohibas ( os melhores charutos cubanos )  e surgia, vez por outra,  na rede estatal de rádio e TV para  fazer, com voz de bêbado,  suas longas e fastidiosas falações. Era antevéspera do Natal.  Papai Noel,  símbolo do consumismo capitalista,  ainda não conseguira  passaporte para circular com seu trenó e suas renas   distribuindo presentes aos ¨chicos ¨  e ¨chicas¨  cubanos. No distante leste europeu o socialismo desmoronava.   O  ditador romeno Ceausescu,  e sua mulher Yelena, eram fuzilados.    Em Cuba ninguém sabia de nada. Fidel surgia na TV.    No outro dia, pela manhã , um carro de alto-falantes percorria as ruas do bairro Vedado,   em Havana,  anunciando que naquele fim de ano ( não se falava em Natal ) os cubanos teriam o direito de comprar três garrafas de cerveja , e até iriam  comer frango fresco,  naquele momento   vendido  numa rua próxima.  Curioso, o jornalista corre –mundo  foi ao local. Havia uma  enorme fila, e os frangos abatidos, inteiros, estavam amontoados na carroceria do caminhão militar de fabricação russa.
O jornalista,  10 anos antes, batera perna pelo mundo socialista.     
 Em Berlim Oriental  notou  as longas filas    em todas  as biroscas estatais que vendiam alimentos. O mesmo sucedeu na Tcheco-Eslováquia, na Polônia.
Em Havana, conversando com o motorista de um taxi clandestino,    coronel ,   ex-comandante de tropas que Fidel mandara para lutar na África,  revelou-se surpreso e decepcionado ,  e perguntou  ao  oficial- taxista, qual a causa daquela  reduzida oferta de alimentos.  Ouviu do militar  a explicação que detonava um dogma do regime de Castro: ¨É Preciso que nos deixem criar galinhas, e que elas e outros produtos  possam ser vendidos em feiras -livres.¨
A generosa ideia  socialista teria sobrevivido,  e possivelmente criado um mundo novo,  se não houvessem cometido o grave  erro autoritário,  sufocando  a capacidade de iniciativa, o empreendedorismo  das pessoas, que  oxigenariam a hermética  economia estatal. As feiras- livres,   como o nome está a indicar,  são o resultado da liberdade que cada um tem para produzir, para  vender, para comprar, para assegurar a própria subsistência.
O Estado será, para sempre, incapaz de montar uma feira-livre, que é o resultado da  complexa rede  que espontaneamente se forma, se articula, se movimenta.  A feira é livre porque nela o Estado não mete o seu burocrático e ineficiente bedelho.
 Em Aracaju estão  querendo burocratizar as feiras –livres,  sob o pretexto de que elas são imundas, anti-higiênicas , desorganizadas e incomodas. Houve a interferência do Ministério Público, que até fixou prazo para  a ¨regulamentação ¨,  e a Prefeitura parece  entusiasmada com a ideia, tanto assim, que o eficiente  Carlos Batalha,  Secretário da Comunicação, que tão bem conhece o seu ofício e faz jus ao nome quando se envolve numa polemica, sem dúvidas excedeu-se, e deixou no ar, primeiro, a impressão de preconceito,  segundo,  a suspeita de que haveria na Prefeitura de Aracaju a deliberada intenção de prejudicar os feirantes, enquanto os ávidos supermercados,  aqui cartelizados,  estariam comemorando.    Batalha disse, e certamente da frase infeliz irá se desculpar, porque não é arrogante: ¨Recomendo sempre à minha família que jamais compre qualquer coisa nas feiras – livres ¨.   As feiras –livres são uma atividade  sobretudo democrática,  popular,  e de uma enorme importância  para criar alternativas de compras e gerar empregos. Das feiras-livres dependem milhares de famílias, e nem o Ministério Público nem  a Prefeitura de Aracaju devem , voluntaria ou equivocadamente,  gerar um clima de insegurança e de medo para esses milhares de famílias.
Medidas visando melhorar as condições de higiene podem e devem ser adotadas, como se  fossem,
  e são, simples ações de rotina, sem ameaças, nem  autoritarismo. Como bem observou o atilado radialista  Marco Aurélio, no  recordista programa de George  Magalhães, feiras-livres fazem parte da nossa cultura, mais arraigadamente, da cultura nordestina,  e mexer com hábitos e tradições do povo é sempre uma atitude que tresanda odor retrógrado de autoritarismo e arrogância, ou, insensibilidade. 
    Seria recomendável que os artífices dessa desnecessária trapalhada se desfizessem dos seus atavios burocráticos, ternos escuros, gravatas, saltos altos e scarpins.  Como gente simples, destituídos das formalidades e  das pompas dos seus cargos, fossem dar uma volta pelas feiras-livres, aproveitando para conversar com vendedores e fregueses, talvez então, voltassem a pisar no chão fascinantemente rico da nossa cultura, da forma de vida do nosso povo,  da nossa realidade que não nasceu nos gabinetes refrigerados, nem por eles será alterada.
Para completar o tour de force em direção ao andar de baixo da nossa  sociedade  ainda tão aristocraticamente discriminatória, colocassem todos, nos seus aparatos de som, a música Feira de Mangaio,  do genial Sivuca  e sua mulher Glorinha Gadelha. Iriam entender melhor o que é uma feira-livre.
 Deixem livres as feiras-livres. Foram elas, aliás,  que ajudaram a Europa a ir  se libertando da camisa de força da  sufocada economia  feudal. Com isso, a nobreza perdeu, e o povo ganhou.

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