quinta-feira, 2 de maio de 2013

SERGIPE, A PROVÍNCIA DAS TARTARUGAS



SERGIPE, A PROVÍNCIA DAS TARTARUGAS

Sabem a quem pertencem hoje todas as praias de  Sergipe ?  A resposta pode ser surpreendente:  quem impera absoluto sobre todas elas é o Projeto Tamar. E o  que vem mesmo a  ser o Projeto Tamar?  É aquele que cuida das tartarugas, diga-se , por justiça, com muita dedicação e zelo.
 O problema é o exagero.
Faz 30 anos, as tartarugas de couro,  a oliva, mais ainda a de pente, estavam  ameaçadas de extinção.    Chegou a Sergipe  o Projeto Tamar, indo fixar-se em Pirambú, e  na Bahia, na praia do Forte.
As tartarugas,  no verão, sobem à praia para desovar acima da linha d´água, na faixa de areia fôfa.  Escavam um buraco  e nele depositam centenas de ovos    que parecem bolas de ping-pong. Quando os ovos eclodem os quelônios recém nascidos andam, com a rapidez possível a uma tartaruga, em direção ao mar.  Surgem as  aves marinhas, que  os dizimam.  No mar,  os  cações, ( tubarões ainda pequenos )  devoram outra parte. Os sobreviventes  escapando depois das redes dos pescadores, dos hélices de embarcações, da poluição, fazem  longo períplo pelo  Atlantico,  pelo Mediterraneo.  Uns  30  anos depois estarão de volta à praia onde nasceram, para dar continuidade   à espécie.  A natureza é um belíssimo poema. Para os que crêm,   concebido por Deus, o  supremo poeta, para os agnósticos, uma conjugação de fatores cósmicos dando origem às estrelas,   aos planetas, num deles, a terra ,  surgiu a vida, nele, estão as  florestas, os mares,  a tartaruga,  o beija –flor,  também, o presunçoso  dominador homo – sapiens, poderosamente armado com a inteligência.
Faz mais de meio século um grupo de jovens veranistas,  na Atalaia Nova,  andava à noite   pelo alongado da praia extensa,   procuravam  rastros  bem visíveis que as tartarugas, pesadonas, deixavam na areia, no trajeto de ida e volta ao local onde depositavam os ovos. Localizá-los era então muito fácil. Depois, havia a cervejada acompanhada do tira gosto, os  saborosos ovinhos cozidos. Mais difícil do que conseguí-los   era esfriar a cerveja na única geladeira a gás, na bodega do seu   Carmelo.  Desde a Atalaia Nova até a foz do Japaratuba,  em Pirambú,  na praia escura, esbatia-se, esmaecido, o facho rotativo de luz projetado pelo farol  de Aracaju, hoje transformado em monumento.  Quando as praias se enchem de luzes,  dizem  biólogos do TAMAR, as tartarugas perdem o rumo. Há controvérsias.
 O TAMAR resolveu  doar a faixa costeira sergipana aos quelônios, bicho que foi colocado no  centro de um universo  onde todo o resto deve girar em torno dele. A Petrobrás  paralisa suas atividades por 4 meses nas  plataformas,  para que a tartaruga  impávida e sobranceiramente desove.  Há um  gigantesco prejuízo, e também desemprego. Por isso, o campo de Piranema  sofre atrasos, por isso, a empresa  planeja suspender    suas atividades em águas rasas no litoral sergipano.
 O Tamar  dará  aos trabalhadores o emprego que eles perderão ? Devolverá os recursos que recebe da Petrobras para cuidar das tartarugas ?
 Na Praia do Forte o Tamar estabeleceu uma relação produtiva com o turismo, ja em Pirambu, em consequência de tantas restrições, a cidade  fica espremida, para não ultrapassar os limites exclusivos das tartarugas, e  não surgem hotéis, pousadas, para que a luminosidade não afaste as ¨parturientes¨ que vêm do mar. Só de passagem, é bom lembrar que parturientes, humanas,  aqui mesmo em Sergipe, não  entram facilmente numa maternidade.

 O  bom senso  não é privilégio exclusivo de biólogos nem de jornalistas, nem de filósofos ou sábios, é um  recurso disponível em todas as mentes onde exista a inteligência. E o bom senso  estaria a recomendar  uma reflexão sobre certas práticas intituladas ambientalistas que costumam ultrapassar os limites da racionalidade, exatamente como é o caso do TAMAR em Sergipe. Passado tanto tempo já se poderia ter feito uma avaliação sobre aquela visão inicial     a respeito do problema das tartarugas ameaçadas , e assim se poderia até constatar que hoje muito mais ameaçados estariam, por exemplo os sapos, bicho desgracioso, todavia responsável pela manutenção sob controle da explosiva população de insetos.
Os jovens que nos anos 50 e 60 cometiam o ¨ crime ecológico ¨ de comer ovos de tartaruga e também, eventualmente, de  transformar uma delas  no requinte gastronômico de uma suculenta sopa, não eram selvagens , violentos, ou devastadores. Eles, embora alguns já estivessem nos bancos acadêmicos,  desconheciam a palavra ecologia, e nem faziam ideia do conflito entre o biótopo, o meio natural,  e a biocenose,   que Theillard de Chardin  situa na noosfera,   campo da  inteligência,  que produz a intervenção antrópica, ou seja, a ingerência humana no meio natural.
   Na sociedade   de consumo, cibernética, capitalisticamente  revolucionando, constantemente, os meios de produção, como Marx já antevira no século XIX, o conflito agudizou-se.  O progresso  a reboque do mercado,  caminha para exterminar o último traço do meio natural.
Com o planeta hospedando 7 bilhões de seres humanos e os recursos naturais dando sinais de exaustão , sumida, no baú das inutilidades, a teoria de  Malthus  vai sendo reabilitada.
Mudar o paradigma da produção e consumo é o desafio para esta, e muitas outras gerações que virão. A grande revolução,   que terá de ser abrangente, globalizante,  transformaria em meros episódios localizados, as revoluções francesa ou mesmo a russa. Mas,  a gigantesca correção de procedimentos não se fará com armas, apenas, ou  melhor, sobretudo, com a conscientização, e isso a tornará mais complexa , difícil e alongada.
No ecossistema que  ecólogos como esses do Tamar concebem,  o ser humano  é visto como habitante inoportuno, intrometido, que  , se possível, deveria ser retirado de cena.   Então, o mundo se libertaria da  humanidade, aquele aglomerado desprezível de gente  desgraçando o planeta  que, definitivamente livre deles,   se transformaria no paradisíaco habitat das tartarugas.  

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