segunda-feira, 18 de março de 2013

AS CINZAS E A VIDA DE LOURIVAL



 AS CINZAS  E A VIDA DE LOURIVAL
Na igreja Jesus Ressuscitado celebrava o padre Peixoto a missa de sétimo dia  de Lourival Baptista.   Em frente ao altar uma pequena urna guardava as cinzas do ex-governador, ex-senador, ex-deputado, e  ex-prefeito.  É parte emblemática da liturgia de Páscoa, aquela frase que repetem os párocos: ¨Lembra-te homem que és pó e ao pó  retornarás¨.   Em Lisboa o Padre Vieira usou a sonora e solene advertência para construir um dos seus mais expressivos sermões,  em que fez um pingue pongue teológico entre  o corpo que é pó,  e a alma que estaria acima do tempo e dos estados da matéria.
Lembrar que nos transformaremos em pó,  é antídoto contra as vaidades, acreditar na superação dos limites da matéria é ter a certeza ou a ilusão de uma outra existência. Lourival, o homem de quem ali estavam as cinzas, galgou quase todos os degraus do poder  acessíveis a um político. Gostava do poder, e o utilizava para fazer e servir. Gostava de ser reconhecido, admirado, gostava de figurar nos noticiários, e sabia muito bem fazer o seu marketing,  mas, tinha uma visão muito pessoal,  marcadamente irônica em relação ao poder e às engrenagens que o constroem e alimentam. Por isso, cultivava  um faro especial para distinguir entre o amigo e o simples bajulador. Não recusava a lisonja, mas,  logo depois tirava do bolso um amuleto, e o segurava  forte, como se estivesse a pedir proteção contra os descaminhos do ego.
Quando era governador, Lourival recebeu ao findar de uma tarde um conhecido político que andava a alardear os benefícios à saúde que lhe causava a ioga. Tanto falou sobre as modificações produzidas no seu corpo pelo exercício corporal e mental , que Lourival o desafiou a mostrar as suas habilidades. O homem sem retirar o paletó, deitou-se sobre o tapete, fez contorções, e logo se pôs na posição conhecida como plantar bananeira. Ereto verticalmente  de ponta cabeça, enquanto desabava-lhe  pelo rosto o paletó, despejando ao chão, carteira, óculos, caneta. Cinco dez minutos passaram, e o homem lá  de sapatos  para cima,   o rosto envolvido pelo saco em que se transformara o paletó lustroso. Enquanto isso, Lourival mandou chamar um jovem amigo que ele sabia, estava na ante- sala. Terminada a grotesca ou ridícula exibição, o iogue despediu-se, recebendo do governador calorosos elogios.
 Lourival permaneceu algum tempo silencioso, o braço sobre o espaldar da cadeira , a mão segurando o queixo.  Soltando o riso que estava contido disse ao jovem que mandara chamar:  ¨Lhe chamei para que você visse até aonde vai a sabujice das pessoas. Eu fiquei envergonhado e ele saiu pensado que agora  será atendido um pedido  absurdo que  me fez , porque botou a cara no chão ¨.
A vida de Lourival Baptista é rica em episódios assim, que revelam o ser humano que o político exuberantemente mostrava,  também as vezes escondia, ou disfarçava.  Nos próximos domingos estaremos a contá-los.

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