domingo, 21 de outubro de 2012

ARACAJU SEGUNDO JOEL SILVEIRA



 ARACAJU SEGUNDO JOEL SILVEIRA
Joel Silveira foi o mais primoroso dos nossos escritores. Homem dúbio no trato,  que ora se fazia doce, outra vez quase furibundo, Joel ,   sensível artista da palavra levava aos textos que produzia a dubiedade de sentimentos que o avassalavam. Era o combatente político, o mordaz critico de erros, de atentados à liberdade ,  ferino contra desafetos,  mas,  sempre pronto a ressuscitar de dentro da sua tormentosa inquietude, aquela  doçura  que escondia nos gestos,   só deixando-a  fluir naquilo que escrevia com a alma leve do cronista poeta.
Reproduzimos  a crônica intitulada Aracaju Cheia de Graças publicada no numero primeiro da Revista de Aracaju,  em 1943, trazida ao escrevinhador que a perdera e a procurava ansiosamente,  pelo emérito e  cheio de méritos  pesquisador,  Gilfrancisco:
INICIAÇÃO LÍRICA
¨Daqui você poderá ter uma visão geral da cidade. Seus olhos se estendem e mergulham , primeiro na brancura da areia que cerca Aracaju. Você já viajou muito, Sabe portanto  que não existe em todo Brasil areia mais branca do que esta. É uma brancura misturada de sol. Os seus olhos se enchem dessa luz que fere,  uma luz sem sombras. Então você sabe que para se falar de Aracaju é preciso, antes de tudo, falar dessa areia branca que a rodeia como um mar de espuma. Depois são as ruas retas que só acabam onde a cidade acaba. Acompanhe o caminhar certo e regular desta avenida grande que está aos seus pés. La vai  ela, bem devagar, mas sem uma só curva. Assim são todas as ruas de Aracaju. Ande por esta cidade sem medo. Você não encontrará becos nem vielas  penumbrentos.  Você talvez sinta falta de uma ou mais casas velhas onde o seu pensamento possa distrair-se nas coisas do passado. Mas ao mesmo tempo você notará que a claridade da cidade e a ausência de sombras e velharias, compensarão tudo.¨
CONVITE
  ¨O barulho da cidade grande está expulsando a poesia e a ingenuidade que existiam dentro de si. Fuja depressa, venha para a Aracaju cheia de graça. Aqui você poderá se encher totalmente de crepúsculos e auroras. E há tempo e tranquilidade para você pensar em todas as coisas boas que a vida vai deixando para  atrás ;  suas namoradas que fugiram, seus amigos que morreram, sua infância que ficou em qualquer parte. Venha. Traga seus poemas. Não os tem?  Pouco importa você os fará aqui.
Sei que a cidade grande está matando a poesia que vivia consigo. É muito triste, um dia,  você não ter mais prazer em olhar certas coisas belas da vida – as crianças, as flores, as nuvens. Fuja depressa. Aqui, nesta Aracaju cheia de graça, você será leve como um assunto. Venha. ¨
Transcritos o começo e o final da crônica,  fica a sugestão ao prefeito Edvaldo Nogueira: Joel havia dito que quando morresse não queria ser nome de ponte, e terminou sendo, e deve ter, apesar do que disse, gostado da homenagem que lhe fez  o governador Marcelo Déda. Pois então, ao pé da ponte,  quando ela chega às terras de Aracaju saindo de Itaporanga, ultrapassando o Vasa Barris,   mande, prezado  findante  alcaide,  ainda no seu tempo de mandar, erigir uma segunda homenagem , esta,  ao texto de Joel, transformando-o numa espécie de saudação-convite aos que chegam a Aracaju.  A parte final da crônica Aracaju Cheia de Graça poderia ser inscrita num vistoso mural.  Ele despertaria a curiosidade de alguns viandantes turistas, que, de logo, estariam embevecidos pela perspectiva de ¨crepúsculos e auroras ¨.  Talvez,  até melhor visíveis na Orla que o próprio Edvaldo construiu,  margeando  aquele rio  por aqui tão largo, tão  farto de água no encontro com o mar. Nem parece  o  filete titubeante, nascido  além  da serra do Cambaio, nas securas do Raso da Catarina. O Vasa Barris, disse  Euclides,  num exagero retórico de correspondente de guerra,   ¨desceu rubro de sangue até o mar ¨ depois do último combate pela cidadela de taipa de Canudos.

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