terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

QUANTOS UM PRESIDENTE MATA


QUANTOS UM PRESIDENTE MATA

Os biógrafos dos ex-presidentes norte-americanos, mesmo aqueles que fogem do faccioso modelo laudatório, nunca se preocuparam em revelar a cifra, ainda que aproximada, das mortes causadas pelas decisões guerreiras de todos os que ocuparam a Casa Branca desde que o país deixou de ser colônia da Inglaterra. A independência americana foi feita ao preço de muitas vidas, os combates com as tropas inglesas que ocupavam o país foram longos e sangrentos. Os presidentes, numa sucessão sem exceções, foram todos eles comandantes em chefe de tropas envolvidas em guerras por eles também decididas. Assim, cada um tem uma cota de mortes causadas ou sofridas por tropas sobre as quais exerciam a sua prerrogativa de comandantes supremos. Depois veio a guerra civil, a luta travada entre o norte industrializando-se e o sul escravagista e agrário que pretendia separar-se. Na formação das nacionalidades não há como escapar da necessidade de uma argamassa de sangue para alicerçar a independência.
Houve ainda o extermínio sistemático dos índios, genocídio, aliás, comum em todas as Américas. Desse morticínio de indígenas resultaram heróis cinematográficos, e nenhum sentimento de culpa. O rápido desenvolvimento do capitalismo com a avidez pela conquista de mercados e de territórios deu ao país a feição imperialista que agregou definitivamente a presença do poderio militar no século dezenove, com a ação das canhoneiras que singravam os mares, fazendo o exato roteiro dos interesses das corporações nascentes.
A Doutrina de Monroe, aquela que preceitua: A América para os americanos, traduz exatamente a dimensão da visão expansionista de uma potência que definia como área exclusiva da sua dimensão geopolítica as vastidões de dois continentes, indo da Terra do Fogo ao Alasca. O México encolheu, a América Central virou fazenda da United Fruit, que criou as bananas republics, o Canadá, colônia inglesa, tornou-se também quase uma extensão dos Estados Unidos. No Brasil, a elite cafeeira-açucareira dominante entendeu que era hora de começar uma troca de bandeira, e as companhias inglesas não receberam o suporte que esperavam, ao sentirem que o Tio Sam chegava com a disposição de assenhorear-se do mercado que Dom João VI, desde a abertura dos portos, havia submissamente reservado para desfrute exclusivo da Inglaterra. Esse controle de toda a extensão da América espanhola e portuguesa se fez, quase sempre, com o uso da força bruta. Os marines, onde desembarcavam, vinham garantir a sobrevivência de ditadores títeres, ou por ordem na casa, quando um governante se tornava pouco susceptível aos interesses dos gringos, e era preciso submetê-lo pela força das armas. Theodore Roosevelt, presidente caçador que exterminou uma boa parte das onças pintadas do Pantanal, e veio várias vezes aqui para mapear nossas riquezas minerais, ainda ganhou uma homenagem: um rio no Mato Grosso que leva o seu nome. Na Casa Branca ele pôs em prática a doutrina do porrete, o big stick. Por esse tempo, os yankees já achavam pequeno o seu quintal da latino-américa, e se expandiam pelo mundo. Cada presidente daquele período tem a seu favor na contabilidade sinistra que se faz sempre com números na casa dos milhares, muitas mortes em decorrência das operações com o envolvimento direto das suas tropas, ou usando mercenários locais nas empreitadas em busca sempre de maiores lucros. Não há, desde a fundação dos Estados Unidos, um só presidente que tenha concluído o mandato sem fazer uma guerra, sem levar morte a alguma parte do mundo.
Jimmy Carter que perdeu a reeleição por ter o grave defeito de ser pacifista, teria sido o único, se não houvesse autorizado a operação de resgate dos reféns que os militantes agressivos dos aiatolás iranianos mantinham na invadida embaixada americana em Teerã. Os helicópteros sobrevoando em baixa altitude o deserto foram surpreendidos por uma tempestade de areia, muitos caíram e vários soldados morreram. Por muito pouco Carter não conseguiu a proeza de durante o seu mandato não ter havido aquela cerimonia quase corriqueira, dos caixões envolvidos pela bandeira de listras e estrelas carregado aos ombros de cadetes engalanados. Os outros enterros, aqueles, dos mortos pelas tropas americanas, esses, jamais são mostrados, acontecem longe das câmeras de TV ou das lentes de fotógrafos, que, naquelas ocasiões, nunca estão por perto, e se estão, a mídia raramente acolhe suas imagens.
Só para lembrar os mais recentes presidentes, se poderia tentar saber quantos soldados americanos, quantos estrangeiros foram mortos durante os mandatos de Kennedy, Lyndon Johnson, Ford, Nixon, Ronald Reagan, Bush pai e Bush filho. Contando-se os mortos no Vietnam, Camboja, Laos, naqueles bombardeios aéreos usando-se o napalm ou o veneno terrível do agente laranja, a impiedosa destruição de cidades como Hanói, Bagdad, a mortandade chega facilmente a alguns milhões de mortos. No Vietnam ainda hoje morrem pessoas, nascem crianças deformadas, vitimas retardatárias da ação demolidora da guerra química. Mas no Japão também nascem ainda, passados 66 anos, crianças com as marcas dos efeitos da radioatividade das duas bombas atômicas lançadas sobre Hiroshima e Nagasáki em agosto de 45. Alguém dirá: s americanos estavam em guerra com o Japão, foram agredidos pelos japoneses que começaram a guerra e ainda resistiam duramente.
Quando ordenou o lançamento das bombas, o presidente Truman tinha outros motivos além daquele imediato que seria a rendição do Japão. Na geopolítica americana que abrangia todo o planeta, o poder atômico se tornava o diferencial estratégico que precisava ser exibido, principalmente aos russos que haviam colocado as botas sobre a Europa do leste e chegado primeiro a Berlim.
Se morreram 200, 300 mil ao longo do tempo, nunca se chegou a uma estatística perfeita. Bush filho, com certeza, matou muito mais.
Barack Obama que até acenou com a chegada de tempos pacíficos, ampliou a guerra no Afeganistão, também matou na Líbia, e tem a seu favor um cartel de algumas centenas de soldados americanos mortos, e uma quantidade bem maior de inimigos abatidos. Dissemos tem a seu favor porque a sua reeleição já está quase garantida, depois que ele, repetindo Bush, vestiu a farda de guerreiro.
 

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