Diz Castro Alves, fulgor de gênio que brilhou apenas 24 anos, num dos seus mais belos e mais difundidos ( seriam ainda? ) poemas, O Livro e a América: “Oh! Bendito o que semeia. Livros livros à mão cheia. E manda o povo pensar. O livro caindo n’alma. É germe – que faz a palma. É chuva – que faz o mar. “ Anda o poeta dos escravos tão esquecido, não só ele, todos os poetas. No mundo em rede, tuitando, feicebucando, orkutando, guulgogando, resta mínimo ou nenhum espaço para a poesia. A rede que fez do mundo aldeia causa um curioso fenômeno: Na virtualizada comunidade, quase todos se comunicam, poucos se conhecem. Sem a proximidade física suprime-se a emoção da voz, dos gestos, desaparecem sentimentos, antes visivelmente exteriorizados e permutados. A rede amplia horizontes de relacionamentos ao mesmo tempo em que os tornam desumanizados; a escrita usual desaparece, substituída pelos signos da Internet que exprimem o abreviado dialeto das tribos digitais. E agora se diz que o livro já tem morte anunciada. Os e-books, os tabletes, iriam definitivamente aposentar, retirar de cena, tanto o jornal como o livro, aqueles mais diletos filhos da prensa de Gutenberg.
Umberto Eco, o autor de O Nome da Rosa que termina o seu enigmático romance ateando fogo à biblioteca do mosteiro, diz, sapiente, negando-se a aceitar o óbito do livro: “O livro é como a colher, o martelo, a roda ou a tesoura. Uma vez inventados não podem ser melhorados. Você não pode fazer uma colher melhor do que uma colher. O livro venceu seus desafios, e não vemos como, para o mesmo uso, fazer algo melhor que o próprio livro. Talvez ele evolua em seus componentes, talvez as páginas não sejam mais de papel, mas ele permanecerá o que é. “
Para a poesia parece mesmo não haver remédio. Ela ficará restrita cada vez mais a pequenos grupos. O desinteresse pelo poema aumenta acompanhando as transformações que se processam tão aceleradamente. Nos céus fumarentos das cidades já não brilham mais a lua, as estrelas. Nos campos também iluminados, as noites são fluorescentes. Amor é poesia e vice versa, e quem mais se atreveria a fazer uma serenata ? Na Internet o que prospera é a degeneração da pedofilia. Admitamos, então, que a realidade é mesmo adversa para a poesia, mas, nem por isso teremos de aceitar passivamente o abandono do livro. E não é a ameaça eletrônica que faz medo. A grande ameaça ao livro é o esquecimento da leitura. As livrarias sobrevivem graças à venda do livro didático. Poucos consomem a literatura. E agora qualquer coisa se encontra fácil na Internet, nem é mais preciso pesquisar, tudo já se oferece pronto e acabado. Então, por que remexer estantes buscando livros ocasionalmente relembrados?
A Secretária da Cultura Eloisa Galdino fez, semana passada, uma assustadora revelação. Indo ä Biblioteca Pública Epifanio Dória para fazer a entrega de livros comprados pela sua Secretaria, ela revelou que, há exatamente 22 anos, o acervo daquela biblioteca não era acrescido com a compra de novos livros pelo estado. Chegaram esporádicas doações, mas, compra mesmo de volumes novos somente agora aconteceu, após tantos anos. Ou seja, o último aporte de livros novos à Biblioteca Pública adquiridos pelo estado, ocorreu ainda quando era governador, Augusto Franco, e para cuidar mais especificamente de um assunto um tanto posto à margem em nosso meio, Augusto Franco mandou um projeto à Assembléia criando a Subsecretaria da Cultura, que era parte da Pasta da Educação, então comandada pelo deputado federal Antonio Carlos Valadares.
Sem que se criem atrativos para a leitura, sem que se levem livros ao povo, como recomendava o poeta, o livro quase desaparecerá antes que se confirme a previsão de que será golpeado de morte pelo seu sucessor eletrônico.
Nenhum comentário:
Postar um comentário