LUZES E SOMBRAS DO
NATAL EM ARACAJU
Ideia quase sublime, ou talvez
meramente utópica do Natal, seria a intensidade das luzes fulgurando nas
vitrines, e ao mesmo tempo iluminando a consciência das pessoas. Convenhamos,
vencer a escuridão e fazer surgir a claridade é bem mais fácil, apenas uma
questão de tecnologia e de recursos disponíveis para utilizá-la.
As coisas muito se complicam quando
se trata de clarear consciências, metáfora do que seria, exatamente, livrá-las
da mesquinhez, do egoísmo extremo, o mesmo que uma síndrome de desamor.
O exclusivismo do EU, no mundo
violento, competitivo e desumanizado em que vivemos, é a carapaça de proteção à
qual recorremos, e dentro dela nos isolamos, então, no nosso canto escurinho
sentimo-nos protegidos, e nem atentamos para o fato de que, ao derredor, tudo o
que é sólido desmancha no ar, tal qual descreveram Marx e Engels no Manifesto
Comunista. Chegando aos dois séculos o Manifesto tornou-se obsoleto, embora
contendo verdades atualíssimas.
A esperança de amor e solidariedade
que um pacificador despertou já faz 2 mil anos, não estiolou-se no deserto, e
dela não nos desgarramos, ainda, porque é a mesma identidade com o bem que
carregam as religiões, sejam cristãs, afro, islâmicas, budistas, hinduístas. O
Natal poderia ser o símbolo de tudo isso, todavia, trocamos presentes e comemos
peru, e tantos passam fome olhando as luzes feéricas dos templos do consumismo.
Tudo isso que dissemos tem um viés
piegas, e de pieguices o mundo transborda, ainda mais daquele modismo
chatérrimo da autoajuda: ¨Seja bom, seja do bem, cubra de ouro o seu coração
para fazer dourados os outros corações¨.
E por aí vai o infindável e tão
acolhido besteirol.
Francisco, aquele verdadeiramente
iluminado Papa, fez, às vésperas do Natal, um desabafo da sua preocupação com
os ¨Príncipes da Igreja¨ tão luminosos por fora, tão obscurecidos por dentro.
Voltemos então às luzes do Natal, do
Natal aqui em Aracaju.
Sejamos pragmáticos, não esperemos
que nos natais que virão haja uma iluminação de consciências, apenas,
imaginemos possível um Natal bem diferente deste que acabamos de viver.
Projetemos, para os natais futuros, uma Aracaju, que tanto padece da escuridão
ficando iluminada, e que, pelo menos, o reflexo dessas luzes clarifiquem um
pouco a nossa imensa insensibilidade.
Falta-nos, sobretudo, um sentimento
coletivo de afeto e orgulho em relação à nossa cidade. Assim, ficamos a esperar
pelas ações do Poder Público. Este ano bateu a quebradeira, e a Prefeitura fez
exclusivamente o indispensável. O parque Augusto Franco, a Sementeira, permaneceu
sendo um exemplo do que pode ser feito pela iniciativa privada, e foi feito
pela Energisa. É isso, a iniciativa privada precisa ser chamada a
participar, evidentemente, sem que o Poder Público se exima da sua parte.
O Museu da Gente Sergipana ficou primorosamente
iluminado. E, o que é melhor , com gastos reduzidos. Ézio Déda,
arquiteto-artista e gestor eficaz, tem mantido no Museu o nível sonhado por
Marcelo Déda.
Então, procuremos juntar esforços,
buscar cabeças inteligentes, criativas. Nisso, que se reúnam os poderes
públicos, as entidades privadas, os clubes de serviço, as Igrejas. Neste Natal
as igrejas estavam escuras, a começar pela Catedral; no Santo Antonio, a Igreja
que é visível de quase toda a cidade não tinha uma só luzinha a tremeluzir.
Os bancos, que faturam tão alto, não
iluminaram as suas fachadas. Até a Orla da 13, onde se concentra boa parte do
PIB sergipano, foi mesquinha na decoração natalina.
O maestro Manis que levou a nossa
Sinfônica a um patamar elevado, poderia ter tido a oportunidade para
apresentá-la ao ar livre, nos espaços públicos, o mesmo fariam outras
orquestras, a de Itabaiana, por exemplo, além de bandas, corais,
artistas sergipanos.
Nada se fez e o nosso Natal murchou.
Vamos pensar no próximo, e
que nele haja também a disposição para fazer as luzes natalinas clarearem um
pouco as consciências. Tomemos a decisão de mostrar Aracaju sem uma só criança
abandonada nas ruas. Tenhamos iniciativas filantrópicas, mesmo que venham com a
hipocrisia daqueles paliativos pontuais, mas que venham, que se multipliquem, e
que não voltemos a oferecer, no próximo Natal, aquele espetáculo deprimente,
desolador, das famílias miseráveis que se foram abrigar sob marquises no centro
da cidade, algumas, na calçada da Travessa Jose de Faro, onde estão as agencias
de grandes bancos, que, por não iluminarem suas fachadas ajudaram a manter, na
semi – escuridão, a miséria que eles próprios poderiam amenizar, se fossem
taxados os seus lucros exorbitantes que, de tão vultosos, se tornam socialmente
perversos.
Apaguemos este Natal amorfo das
nossas memórias, mas nos ocupemos a pensar no próximo, nos outros natais que
virão.
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