UM GRINGO BRASILEIRO
UM BRASILEIRO GRINGO
Mangabeira Unger é brazuca vivendo nos Estados Unidos, e professor da Universidade de Harvard. De tempos em
tempos vem ao Brasil , e aqui suas analises sobre o país sempre causam
sensação. E polemicas.
Intelectual respeitado por uns, detestado por outros, nos círculos mais à direita ou à esquerda as vezes é visto como um personagem bizarro.
Mangabeira tem sido um oráculo consultado por muitos políticos, principalmente aqueles, no governo. Brizola foi um deles
quando assumiu o governo do Rio ainda na
ditadura militar afrouxando as rédeas e até permitindo
eleições. Habilidoso e com uma nova face conciliadora, Brizola aproximou-se de Figueiredo,
tornou-se habitual conviva nos churrascos que o general
presidente oferecia na Granja do Torto ,
onde morava próximo aos seus cavalos, cujo cheiro, dizia, era mais tolerável do
que os odores do povo. Brizola levou
Mangabeira a um dos churrascos tentando fazer Figueiredo escutá-lo, mas o
cavalariano não simpatizou muito com aquele patrício que falava arrevesado, como se fosse
um gringo.
Mangabeira e Darcy
Ribeiro, outro dos conselheiros de Brizola, tinham uma mesma característica:
eram exuberantemente entusiasmados com o povo brasileiro, e ansiosamente inconformados com a situação de
um país que apenas tateava pelos caminhos
que o levariam ao futuro, sem conseguir aproveitar as imensas energias
de um povo tão excepcionalmente criativo.
Desde então, Mangabeira Unger tem sido um pensador
energizado pelo sofisticado ambiente acadêmico de Harvard
a teorizar sobre a realidade
brasileira e apontando soluções para os nossos problemas. Ele faz isso através
de um receituário onde estão presentes
propostas surpreendentemente heterodoxas ao lado de outras, comportadamente adequadas ao figurino do
neoliberalismo.
Mangabeira, que
fala o português com alguma relutância, se distancia muito daqueles desprovidos do sotaque gringo, todavia
apegados ao exclusivo modelo que os gringos nos indicam para ser seguido com a
obediência mansa dos cachorrinhos amestrados.
Por outro lado, Mangabeira recusa-se a aceitar o figurino de uma esquerda
que ainda não teve notícia da queda do Muro de Berlim , nesta semana completando
25 anos.
O que ele agora propõe
é a
ruptura desse impasse que sufoca a nação polarizada entre duas
imperfeições políticas em confronto. Rompido o impasse com a assepsia daquela
contaminação ideológica levada ao extremo ,
restabelecido o cordato ritual
democrático, se deveria ir em busca da criatividade, da capacidade de improvisar, inventar e empreender , características do
povo brasileiro.
Momentos em que o este
povo exerceu alguma forma de
protagonismo ocorreram poucas vezes na
nossa História . Nas revoluções dos 20
só apareceram os tenentes; mesmo na revolução
de 30 o povo foi mero espectador. Em 32 os paulistas foram combater
pela redemocratização, e mataram e morreram para manter os privilégios do baronato
cafeeiro. Até na fotografia
que eternizou um momento do delírio
cívico dos 18 do Forte, aparecem em poses marciais os tenentes suicidas e, junto deles, um civil elegantemente trajado. O
proletariado vestindo macacões, nos anos
20 fez algumas greves, alguns quebra-quebras liderados por emigrantes
anarquistas,mas a polícia logo apareceu. Era a solução da época para as insatisfações
sociais. A rebelião comunista de 35, foi muito mais quartelada do que movimento popular, o mesmo acontecendo depois com o putsch dos
galinhas – verdes, os integralistas, na
sua maioria gente da restrita classe
média, intelectuais e a oficialidade da
Marinha.
Povo, trabalhador, gente
pobre, participando e conquistando
espaços, houve mesmo, intensamente, em três ocasiões . A primeira com Getúlio, e o seu
Estado Novo, autoritário, manipulador. Mas no estádio
São Januário ouviu-se, num primeiro de maio, um coral de mil vozes regido
pelo maestro Heitor Villa Lobos, cantar o Hino Nacional, seguido pelo coro sem regente de mais de 30 mil trabalhadores que ali estavam para
ouvir o anúncio do novo salário mínimo, conquista alcançada sobre as oligarquias semi-feudais temporariamente
recolhidas.
Com Lula se fez a
¨descoberta ¨ : mais de 40
milhões de brasileiros passavam fome. Pela primeira vez o Estado brasileiro assumiu
o compromisso de garantir comida para
quem via os filhos nascerem e morrerem por desnutrição. O povo
surgiu, saindo das choças onde a miséria
se recolhia conformada. E esse povo faminto que subiu degraus na escada da
ascensão social, não é somente gente nordestina. O terceiro estado com mais gente no Bolsa Família é a Minas de Aécio, o quarto é São Paulo, rico e
poderoso, de Alckmin e FHC.
O terceiro momento foram os 50 anos em 5 de Juscelino, quando o povo, mesmo
sem cor ideológica, apenas com a
sensação do otimismo gerado pelo
desenvolvimento, passou a acreditar mais no Brasil, e fez Brasília,
siderúrgicas, hidrelétricas gigantes, estradas imensas, se tornou trabalhador qualificado nas
montadoras, nos estaleiros.
Mangabeira propõe um
processo de energização social e econômico movido pela idéia de que não esgotou-se o modelo de transformação, mas deve ser
modificado, sem prescindir do povo nem excluir os atores que podem dar força à
uma economia precisando deslanchar. Para Mangabeira a expansão da
demanda, feita pelo salário maior e pela democratização do crédito, precisa
agora exigir a expansão e democratização da oferta, ou
seja, um choque de produção e produtividade , pela incorporação de tecnologias, pela
educação e o ingresso de novos empreendedores no sistema produtivo.
Lembra Unger que das 500 maiores empresas do mundo quase 400 estão presentes no Brasil, e
sugere que Dilma reúna essas empresas para que se descubra como poderemos participar da formidável cadeia global de
negócios que elas geram.
E recomenda mais, sem
fugir à ortodoxia : Muita responsabilidade fiscal e desoneração completa das
exportações.
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