quinta-feira, 4 de abril de 2013

UM DIA A SER GUARDADO NA MEMÓRIA PARA QUE DELE SE GUARDE DESPREZO



UM DIA A SER GUARDADO NA MEMÓRIA
PARA QUE DELE SE GUARDE DESPREZO
 Hoje é dia 31 de março. Faz quarenta e nove anos, numa noite tensa de expectativas, emissoras de rádio anunciavam a movimentação de tropas sublevadas do exército e da polícia mineira que tinham como objetivo o Rio de Janeiro. O governador de Minas, Magalhaes Pinto, um banqueiro que até poucos dias atrás estava a preconizar reformas na estrutura social e econômica do país, transformava-se no ¨general civil da revolução ¨título bajulatório para não dizer histriônico, que ele logo iria disputar com outro pretendente, o belicoso governador da Guanabara, Carlos Lacerda. Naquela mesma noite, temendo o avanço dos fuzileiros navais do almirante Aragão, Lacerda entrincheirara-se no seu palácio, protegido pela polícia estadual, e para aonde acorriam pessoas com lenços azuis ao pescoço , em adesão ao golpista, e onde se contavam muitos oficiais da reserva da s três Armas. Começou a batalha da comunicação. No Rio, a Mayrink Veiga, emissora controlada por Brizola, e a rádio Nacional, faziam contraponto às informações das rádios mineiras a serviço do golpe. Essa situação se prolongaria madrugada adentro, atravessaria a manhã do dia primeiro de abril, e findaria com o silencio dos que se opunham à ruptura da legalidade democrática. O dia 2 de abril começou em Aracaju com uma cadeia de emissoras, as quatro existentes, Difusora, Jornal, Liberdade e Cultura, sob o comando de um só locutor designado pelo exército, o deputado estadual Santos Mendonça, (que em 1968 seria cassado pela violência do Ato Institucional n 5) anunciando a vitória do golpe, a deposição e prisão do governador Seixas Dória. Na madrugada já haviam começado as prisões. O comando do 28 BC saíra da atitude de cautelosa expectativa, e acionado pelo raivoso coronel Humberto Melo, chefe do Estado Maior da Sexta Região Mi litar em Salvador, invadira o Palácio Olímpio Campos e cercara as dependências da Rede Ferroviária Leste Brasileiro, onde trabalhadores e estudantes montavam um simulacro de resistência que se tornara inútil, quando constatou-se que as armas que estariam guardadas e surgiriam na hora oportuna, eram apenas fruto da imaginação sonhadora dos revolucionários de mesa de bar, que logo amargariam a dureza real dos cárceres e das ilusões perdidas.
Hoje é dia 31 de março de 2013. Faz quase meio século em que uma geração enfiou no baú do tempo a ficção utópica de um regime igualitário, cópia idêntica na imaginação, e deformada pelas realidades diferentes, que se faria da Sierra Maestra em Cuba, ou do Palácio de Inverno em São Petersburgo, palco inicial do poder bolchevista. As armas, todavia, estavam do outro lado, e, vencedoras, manteriam um regime espúrio que se prolongou entre fluxos e refluxos de autoritarismo, até 1985 .
Ano que vem a ¨redentora¨ de 31 de março, ou, se preferem, de primeiro de abril, fará 50 anos, meio século. Dos dois lados restam sobreviventes. Do lado que perdeu, para depois, sem armas, felizmente, dar a volta por cima, os que chegarem até a metade de um século vivos, poderão dedicar-se a uma instigante garimpagem pelo universo do possível, a fim de traçar cenários de um Brasil que houvesse escapado do golpe, e continuado democrático, ou, por outro lado, de um Brasil que houvesse passado pela experiência de uma esquerda revolucionária no poder.
Teríamos aqui reeditado episódios como o fuzilamento dos Romanof, o tzar, sua mulher, seus filhos, postos diante de um pelotão de execução? Teríamos reeditado aquela experiência mais próxima, a da fortaleza de Havana, onde os ¨inimigos da revolução ¨ foram encostados ao muro de pedras e crivados de balas após um julgamento popular e sumário?
Se tudo isso houvesse ocorrido, como estariam os vencedores hoje? Comandando um Brasil igualitário e socialista, ou execrados como os reles ditadores, que o socialismo real revelou na Europa do Leste, sepultados, todos, pelas pedras do Muro de Berlim?
Essas perguntas que ficarão sempre sem respostas, mas que acicatam as dúvidas, servem, pela eterna irresolução do complexo teorema das paixões humanas, como inspiração e alento, para que se reforce a crença na democracia, única fórmula válida e real, para os que sonham construir o mundo, até o mundo novo, sem que seja preciso decepar cabeças, e dar aos cães vorazes o alimento do sangue humano.

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