sábado, 12 de janeiro de 2013

MÁRIO JORGE UMA MANHÃ DE SOL E OS ¨PARAISOS ¨ DO POETA



MÁRIO JORGE  UMA MANHÃ DE
SOL E OS  ¨PARAISOS ¨ DO POETA
 Ele carregava em si a  centelha da genialidade. E aqueles que são privilegiados e torturados por aquela iluminação, costumam ser coerentemente inconsequentes, ou vice versa.  Costumam   descrer,  contestar valores, na sofreguidão criativa de aposentá-los e fazer nascer,  no lugar  das convenções impostas e aceitas,  o consenso  alcançado pelas consciências livres.    Os inconformados iluminam o caminho das utopias. Em 1964 havia um menino imberbe, sentindo que algo de trágico acontecera,   rabiscava  cadernos a anunciar o nascer da revolta e do poeta,  tatuado  pela réstia da centelha que logo iria crescendo,   e lhe incendiaria a mente, no tempo curto entra a adolescência,  a puberdade, e a juventude exígua até os 27 anos. Naquela manhã  de janeiro, bem cedo, e já tão  ensolarada,  todas as inconsequências e todas as coerências se juntaram, e ele acelerou o fusca, sempre em direção ao mar e aos horizontes da Atalaia. Sobre a ponte, o choque, o corpo de quase tísico estendido ao chão de asfalto. Paulo Barbosa,  derramando lágrimas sobre a bata branca, onde não havia uma só mancha de sangue, outras pessoas chegando, numa estrada  por aquela época, dos anos setenta,  quase deserta, e alguns perguntando: Quem é esse menino ? . Por que ele morreu assim ?  A resposta seria fácil, mas   teria de ser precavidamente sussurrada, e seria esta:  -De uma forma ou de outra, as ditaduras sempre assassinam.
 Por ali,  naquela hora, passou alguém que ia  ao Aeroclube fazer um  vôo matinal,  sonhando com  os ares translúcidos  que uma chuva madrugadora lavara. Ajudou Paulo Barbosa a retirar o corpo da estrada,  depois,  sobrevoava a ponte.  Quase encadeado pelo sol ainda mais forte, pareceu enxergar o morto adejando por perto,  tocando   flauta,  saindo dos seus ¨paraísos ¨,  e pedindo passagem para ingressar no outro, com certeza, limpo de alma. Distraiu-se, o piloto, ou deixou-se ficar absorto, o motor andava a 1500 rotações, era preciso acelerar.
O corpo estirado, morto, depois,   aquela espécie de anjo, ou querubim, já flutuando e flauteando pelos espaços,  era o poeta Mário Jorge. Agora,  faz 40 anos que ele morreu.  Sua criação instiga os estudiosos, motiva teses acadêmicas, seu modo de viver, sua trajetória libertária, adorna uma biografia contemporânea de um tempo  que era triste e ameaçador, mas também,  explosiva, irreverente,  e , mais ainda, desafiadoramente criativo, demolidor de valores caducos, inspirador de¨ sacações ¨ que germinavam no tédio oleoso  da opressão e se  corporificavam, fosse em Woodstock, nas ruas de  Paris, nas marchas dos cem mil no Rio de Janeiro, ou nas noite ébrias da Atalaia.  Procurem,  na poesia de Mário Jorge, nos desenhos, nos textos de Mário Jorge, e irão encontrar  a metáfora ou o epigrama daquele tempo.
Ana Lúcia, irmã de Jorge  se fez, como tantas outras pessoas,   - Ilma Fontes destacadamente entre elas,-  curadora da obra,   organizou  eventos , percorreu as quatro décadas desde que se foi o poeta, cada vez mais vivo na sua obra concluída naquela manhã de sol de janeiro, lá se vão,  40 anos.

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