Quando Inácio Barbosa, presidente da província de Sergipe Del´Rei começou a tramar com a plena aquiescência do Barão de Maruim, grande proprietário de terras no sítio dos Aracajus, a transferência da capital, São Cristovão, para os alagados , manguezais e dunas alvíssimas ao lado direito do estuário do Sergipe, esgrimia-se a forte alegação de que ali, naquele local de muitos cajueiros e verdes papagaios, havia a possibilidade de ser construído um bom porto, justificando assim a ousadia da nova capital. Contra o abandono da sua secular São Cristovão, batia-se um líder, gente simples do povo, um artesão, João Bebe Água. Ele não enxergou os interesses imobiliários que poderiam estar ocultos sob os argumentos favoráveis à transferência, mas, prognosticava firme, o fim causado pelas febres palustres de todos os que fossem viver naquela região desconsolada e doentia de pântanos insalubres e infindáveis nuvens de mosquitos. Aracaju se fez vencendo todos os desafios, e os foguetes que João Bebe Água guardava, esperançosamente, para fazê-los subir e pipocar quando fracassasse a ideia do Aracaju, e todos voltassem à velha capital, nunca subiram festivamente aos ares. Simbolicamente, espocaram os foguetes, quando Lourival Baptista, governador e com raízes sancristovenses, ali tendo iniciado a sua vida de médico, transferiu por três dias a capital para a velha cidade, que ele logo classificaria como a quarta mais antiga do Brasil, embora haja controvérsias. Marcelo Déda vem mantendo a tradição das solenidades simultâneas em Aracaju e São Cristovão, no dia 17 de março, marco da fundação da capital nova, quando são relembrados os foguetes de João Bebe Água.
Agora, quando se quer levar uma parte de Aracaju de volta a São Cristovão, nem João Bebe Água no seu túmulo deve estar alegre. Ele era um sonhador, entusiasmado com o cenário da sua cidade encarapitada sobre morros, o que a tornou resistente às invasões estrangeiras, mas, infelizmente hoje, a fortaleza antiga caiu, desmoronou, arrasada pela corrupção que ali tornou-se endêmica e agressiva, somando-se a ela a incompetência e os desmandos. Então, se quer devolver a São Cristovão, mergulhada num caos, uma parte de Aracaju onde foram realizados pesados investimentos públicos, como no Santa Maria, além do Mosqueiro e adjacências, e suas mansões e terrenos valorizados que geram um belo IPTU. Há, separando os dois municípios, um largo curso d´agua , o Vasa Barris, e essas ¨ fronteiras molhadas¨ sempre foram marcos naturais, os mais consistentes, a marcar a divisão de territórios. A prefeitura de São Cristovão que não consegue sequer manter limpa a Praça São Francisco, com tanto sacrifício e luta transformada em Patrimônio da Humanidade, terá de fazer uma difícil ginástica logística para coletar o lixo na parte que será agregada ao seu território. Os caminhões deverão fazer a longa volta , iniciando-a pela rodovia João Bebe Água, chegando até a UFS, avançando depois pela Tancredo Neves, fazendo o entorno de Aracaju, indo até a Atalaia, chegando ao Mosqueiro ao Santa Maria, num trajeto de ida e volta com mais de cem quilômetros. Já se sabe o que vai acontecer: o lixo nunca será recolhido. Este é apenas um problema entre dezenas de outros que podem ser alinhados, contrapondo-se, todos, à decisão infeliz de devolver a São Cristovão uma área de Aracaju que será inadministrável pela Prefeitura daquele município, mesmo se ali existisse um poder municipal competente, o que absolutamente não é o caso.
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