sábado, 10 de dezembro de 2011

UM CANAL QUE VEM DE LONGE


Vem de longe a ideia desse Canal de Xingó que, agora, o governador Marcelo Déda começa a transformar em realidade.
Ainda na década dos oitenta, pessoas retiradas das suas terras inundadas por uma das barragens do complexo hidrelétrico de Paulo Afonso, iniciaram uma luta para que os lotes recebidos, em meio à caatinga ressequida, fossem beneficiados com um projeto de irrigação. O São Francisco não ficava longe, apenas a uns poucos quilômetros. Os que tinham sido afastados das margens do São Francisco continuavam sem nenhuma perspectiva de uma compensação, que seria a água nas suas terras. Foi então que um engenheiro italiano, Ferdinando Facenda, responsável por alguns projetos de irrigação na bacia do São Francisco interessou-se pelo caso dos assentados no chão seco, e começou a estudar um projeto de custo reduzido, sem bombeamento, com a água chegando por gravidade. Esmiuçando a topografia da região, o engenheiro verificou que poderia levar água não só até o assentamento, mas, iria bem mais longe, descendo em curvas de nível por Paulo Afonso, Santa Brígida, entrando por Canindé do São Francisco, prosseguindo por Poço Redondo, Monte Alegre, Glória, ai, ramificando-se o canal, com uma das vertentes chegando até Pinhão, Frei Paulo, e finalmente Ribeirópolis. Tratava-se de um primeiro esboço do Canal Dois Irmãos que surgia, algo portentoso, comparável à uma obra de transposição.
Era um tempo difícil de inflação descontrolada, vivíamos o governo Sarney. O canal que beneficiaria a Bahia, e em maior amplitude a Sergipe, necessitava da articulação forte entre os dois governos. Eram governadores, de Sergipe, Antonio Carlos Valadares, e da Bahia, Waldir Pires. Quem primeiro recebeu o projeto foi o então Ministro do Interior João Alves Filho. Um jornalista de Sergipe tomou conhecimento dele em Paulo Afonso, numa reunião dos assentados com o engenheiro Ferdinando . Então, solicitou uma cópia e a entregou, no aeroporto de Aracaju, ao chefe de gabinete do Ministro, o advogado e professor João Barreto. O ministro entusiasmou-se com o projeto, o governador Valadares desenvolveu gestões para que a obra começasse a andar. Mas, naquele tempo, fazer um projeto com aquelas proporções era algo quase impensável, até porque, o presidente Sarney já definira, como prioridade para a região, a ferrovia transnordestina, que consumiria boa parte do
pouco que restava nos cofres depois de pagar os juros da monumental dívida externa.
O projeto do Canal Dois Irmãos foi guardado numa gaveta, mas não saiu da memória de tanta gente que acreditava na possibilidade da obra que, se realizada, acabaria as agruras de uma das áreas mais secas do sertão baiano, alcançando mais de sessenta por cento do semiárido sergipano. Para a Bahia, com seu imenso território, o Dois Irmãos não seria obra tão estratégica, beneficiaria apenas uma área de dois municípios extremamente áridos, Paulo Afonso, e o paupérrimo Santa Brígida, mas, para Sergipe, seria obra fundamental, abrangeria quase toda a região castigada pelas estiagens. Assim, sem a parceria forte com a Bahia seria mais difícil remover os obstáculos em Brasília. Sergipe, com seu reduzido peso político, teria de lutar quase sozinho. O Canal Dois Irmãos era uma obra complexa, teria um volume de água bem maior do que a nova configuração atual, quando se transforma em Canal de Xingó. Iria perenizar rios intermitentes, teria trechos navegáveis por pequenas embarcações, isso num período em que ainda não se agravavam as condições do rio São Francisco, com suas águas que se tornam escassas, cada vez mais destinadas, apenas, à geração de energia nas imensas hidrelétricas. O Dois Irmãos se ramificaria numa rede interligada de rios e canais, e em alguns pontos exigiria também bombeamento. O projeto do Canal de Xingó é bem mais simples, mais funcional, todavia, mantendo as características básicas da ideia inicial do engenheiro Ferdinando Facenda. Mesmo assim, está orçado inicialmente em dois bilhões e quatrocentos milhões de reais. Não deve ter sido fácil para o governador Marcelo Déda retirá-lo das gavetas para colocá-lo na pauta do governo federal. A presidente Dilma Rousseff já demonstrou que o canal está incluído entre as suas prioridades, daí, certamente, a velocidade com que o ministro da Integração, Fernando Bezerra, chegou a Sergipe para liberar a primeira parcela destinada, somente, à elaboração técnica do projeto.( continua no próximo domingo)

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