OS OVOS DE PÁSCOA E O
PODER DAS REDES SOCIAIS
Costuma-se afirmar que Gutenberg,ao inventar
o prelo, primitiva máquina de imprimir, sepultou a
Idade Média, acelerou o Renascimento, tornando a informação acessível às
massas, retirando os manuscritos
guardados na sua maior parte em conventos para transformá-los em incunábulos,
os primeiros livros rudimentares e com tiragem restrita a poucos volumes. A difusão do conhecimento que
se tornou mais fácil ,ficava restrita a uma elite que sabia ler numa Europa
onde a grande maioria da população era de analfabetos.
Durante a Revolução Francesaa
invenção da tipografia ainda não fizera da imprensa o ¨quarto poder ¨, embora circulassem jornais e impressos diversos, alguns deles
ousando até ridicularizar a realeza, que ainda era absolutista. No século 19 é
que surgem os grandes jornais,intérpretes dos interesses de grupos econômicos e
financeiros, alguns poucos, bem modestos, expressando as ideias de segmentos
políticos que defendiam mudanças
sociais, e já entrando no espectro ideológico a
nova bandeira içada por Marx e
Engels.
No inicio do século 20 ocorre a
primeira manifestação de força da imprensa, que efetivamente começa a exercer
decisivainfluencia, justificando a classificação de ¨quarto poder ¨. No inicio da segunda década daquele século
agudizam-se os conflitos entre as grandes potencias europeias, o ápiceda sede
de expansão colonialista, com a fome de
recursos naturais e de novos mercados, do capitalismo que se globalizava. Os
grandes jornais ingleses, franceses, alemães, austríacos, russos, pareciam
seguir uma mesma linha editorial quando exaltavam o heroísmo guerreiro e
insistiam na inevitabilidade de mais uma guerra europeia. Os grandes bancos haviam financiado a
indústria bélica, e era preciso fazê-laproduzir e vender mais canhões, mais
fuzis, mais gases venenosos, navios de guerra, e até os aeroplanos que
começavam a cruzar os céus , já vistos
como a arma do futuro. De tanto se falou em guerra, de tanto se estimulou o
armamentismo e a circunscrição militar, que umepisódio sem a dimensão de causar
ultimatos, o assassinato do arquiduque
austríaco Ferdinando, e da duquesa sua mulher, em Serajevo, por um nacionalista sérvio, fez com que,
sucessivamente, os governos europeus mobilizassem seus exércitos, que logo estariam envolvidos
na carnificina com amplitude global, a Primeira
Grande Guerra. O que os jornalões influentes da época não previram, quando
estimulavam os jovens a irem alistar-se para combater naquele fatídico ano de
1914, foi a amplitude e a duração do conflito, que se arrastaria até 1918, ao
preço de milhões de mortos, e do surgimento denova configuração geopolítica,
com a ascensão dos comunistas ao poder na Rússia, e do esmagamento da Alemanha, onde a
humilhação se transfiguraria no ódio que pôs em marcha o fanatismo nazista. Do
outro lado do mundo firmara-se o protagonismo dos Estados Unidos, que decidiram
a sorte da guerra com a enorme
capacidade industrial colocando a
atravessar o Atlântico equipamentos bélicos e soldados. A primeira grande
guerra liquidou os maiores impérios europeus, o alemão, o russo, o
austro-húngaro, e debilitou o maior de todos, o britânico, que passou a ser
coadjuvante dos Estados Unidos no xadrez mundial.
A estreia do quarto poder no
palco das grandes decisões mundiais não foi uma coisa a ser relatada como auspiciosa.
A grande imprensa cumpriuo deprimente papel de fomentar a guerra, de iludir e
anestesiar consciências. Não se tem notícia de quemagnatas proprietáriosde jornalão, fosse inglês, francês, alemão,
tenha, movido pelo patriotismo que tanto
exaltaram, ido combater e morrer nas trincheiras do Marne, da Champagne, nas
batalhas navais do Atlântico, do Báltico, ou alojados na carlinga rústica dos primeiros aeroplanos armados.
O morticínio devastador da
Primeira Grande Guerra selou o compromisso entre os responsáveis pela
informação, pela formação da opinião pública,e a esfera dos interesses
econômicos e financeiros. É dessa conjugação de objetivos quetêm, ao longo do
tempo, se alimentado os grandes jornais,
depois, as redes de rádio e televisão.
Imaginar candidamente algo diferente, algo como a ética a orientardecisões dos magnatas
da grande mídia, é ingenuidade
infantil.
A liberdade de expressão,a
intocabilidade do direito de informar, ou até mesmo desinformar, são todavia
fundamentais, porque, existindo essas
prerrogativas democráticas, vigora o pluralismo que resulta do choque de
interesses, e disso tudo se pode formar uma ideia do conflito, e assim, retirar
conclusões.
O surgimento da Internet fez com
que a sociedade deixasse de ser alvo receptivo das mensagens da mídia como
massa de manobrapassiva, sem condições de agir ou interagir.
A Internet faculta a cada pessoa,
uma mídia, comamplo horizonte para reagir, influenciar, debater, explanar
ideias, denunciar.
É essa a grande revolução que se
processa, e que terminará por conduzir um processo de aperfeiçoamento
democrático, o surgimento real, concreto, da democracia participativa que os
parlamentos não souberam ou não quiseram interpretar. Há os inevitáveis erros,
desvios, até crimes, compreensíveis, numa circunstancia ainda inusitada, mas
não chegam a deformar o significado da liberdade ampla de informação e
manifestação do pensamento individual que, somado, se transforma em potencia
coletiva.
Nos dias que antecederamà Semana
Santa houve excessiva manipulação
inflacionária nos preços dos Ovos de Páscoa, uma dessas ¨tradições ¨, ou nada mais do que apelo ao consumismo, mas,
enfim, é do consumismo que se sustenta o sistema, e dele surgem os empregos , a
renda e o lucro, essenciais à economia. Ninguém,evidentemente, é obrigado a
comprar ovos de páscoa, mas as crianças
pedem, as relações sociais recomendam. Então, o sacrifício é feito.
Ai surgiu na rede social a
mensagem que não é nada exemplar ou eticamente recomendável, mas, que traduzia
uma indignação. Recomendava-se a compra mínima de ovos , depois de um processo
de escolha demorado, e nessa escolha, facilmente apertando-se a mão e quebrando
o dobro, o triplo dos ovos que fossem adquiridos. Na quarta-feirafuncionários
de supermercados e lojas de departamento já acusavam um elevado numero de ovos
amassados, quebrados.
Aconteceu sem duvidas um ato
ilegal, mas, no próximo ano,fabricantes de chocolates, as redes de
comercialização, irão se entender mais cuidadosamente, antes de combinarem
qualquer aumento de preços.
Perdeu-seo respeito pelo
consumidor, as redes sociais demonstraram que o desrespeito sempre poderá gerar
consequências. Reduz-se forçadamente a
ganancia, melhora a sociedade.
Não se pode mais ignorar a força
da Internetque evolui para se transformar numa espécie de poder popular, um
autêntico Quarto Poder.